“Só tem saída pelo Legislativo
Por Fernão Lara Mesquita
O Brasil não se lembra mais, mas
foi só a partir de setembro de 2015 que o STF pôs o financiamento privado fora
da lei, valendo para 2016. Todo o Congresso Nacional, o presidente e seu vice e
os governadores eleitos em 2014 tiveram campanhas financiadas pelo padrão
anterior. Os partidos arrecadavam, prestavam contas gerais ao TSE e distribuíam
como quisessem o dinheiro entre seus candidatos. Estes podiam ter doações
individuais também, mas, dispensados de identificar o doador inicial, não
precisavam se preocupar com a origem do dinheiro (o que não significa
necessariamente nem que ela fosse sempre suja, nem que todos desconhecessem
sempre a origem do seu quinhão).
O projeto hegemônico do lulismo e
o salto nas proporções e no significado da corrupção implicados, descritos
minuciosamente na sentença do mensalão, confirmaram que condescender com esse
sistema era um convite ao escancaramento das portas do inferno, e cá estamos
nós. Mas essa era a lei e o País conviveu pacificamente com ela desde o fim do
regime militar.
Se não se lembrar logo de que os
tempos foram assim e seguir embarcando na cobrança com a lei de hoje da
ausência de lei de ontem, aceitando a indiferenciação entre “contribuição de
campanha” e “propina”, acostumando os ouvidos à identificação de “distribuição
de verba de campanha” com “partilha de suborno”, o Brasil vai saltar para o
colo de uma ditadura. Não pela adesão a esta ou àquela ideia, candidato ou
partido, mas por exclusão. Como consequência da destruição, um por um, dos
personagens que encarnam a instituição criada para construir saídas negociadas
e consentidas e da sobrevivência apenas das que existem para exercer o poder ou
impor sanções e barrar desvios à lei, seja ela qual for.
Na apuração de fatos para a
imputação de responsabilidades por um determinado resultado a ordem dos fatores
é tudo. A manipulação da cronologia chegou, entretanto, ao estado da arte neste
país em que “nem o passado é estável”. Sim, sem forçar as leis que temos é
impossível trincar a muralha da impunidade. Mas forçar a lei é desamarrar o
poder, essa força telúrica que corrompe sempre e corrompe absolutamente quando
desamarrada. E esse enorme risco calculado tem de ser levado minuto a minuto em
consideração.
O acidente da hora introduziu em
cena as “condenações premiadas”. Cada um busca leniência como pode e, graças à
cumplicidade de seus pares, safou-se o procurador-geral – e seu fiel escudeiro
– do flagrante delito com a penitência leve de, em 4 dias, requentar provas e
espalhar denúncias para as quais tinha fechado os olhos durante 4 anos. Mas foi
só um pânico passageiro. Reassegurado da sua intocabilidade, voltou ao estado
de repouso a consciência de sua excelência. Desde então o País vem aprendendo
rápido. Primeiro, que nada de muito essencial diferencia as partes envolvidas
na negociação entre PGR e JBS para vender-nos (e uma à outra) gato por lebre e
não entregar nem esse. Segundo, que sendo as culpas de quem as tem o que
determina quem paga ou não pelas suas é a panela à qual pertence o culpado. E
por último que quem decide qual tiro vai virar “bomba” ou ser reduzido a traque
não é o calibre do fato, mas o tamanho do barulho que a televisão fizer em
torno dele.
Os inocentes e os “iludidos”, que
restam cada vez mais, tendem a estar, portanto, entre os que persistem em
acreditar que as generalizações e a recorrência da subversão da ordem dos
acontecimentos até nas altas esferas judiciárias em que se tornaram a regra
sejam só erros fortuitos induzidos pela indignação. Mesmo que fossem, aliás, a
consideração prática a não perder de vista nunca é que, anulados os
representantes eleitos substituíveis a cada quatro anos, o que sobra são 11+1
que se nomeiam mutuamente para cargos vitalícios e que as rupturas da ordem democrática
se dão, hoje, por falência múltipla das instituições de representação do
eleitorado em processos espaçados em anos de “abusos colaborativos” dos que as
minam por dentro e dos que as atacam por fora, até que se crie uma situação
irreversível.
De qualquer jeito, se por um
milagre do divino o Judiciário se tornasse blindado contra todas as tentações
dessa luta pelo poder de criar e distribuir privilégios que está arrasando o
Brasil, ele nada poderia fazer para nos desviar do rumo do desastre porque sua
função não é reformar leis e instituições defeituosas, é impor o cumprimento
das que existem do jeito que são, e as nossas estão reduzidas a instrumentos de
expansão continuada e perenização dos ditos privilégios dos quais,
incidentalmente, os servidores do Judiciário e do Ministério Público são quem
mais nababescamente desfruta, tanto na ativa quanto depois de aposentados.
Exilado da modernidade e
miserabilizado como todo povo reduzido à impotência pelos burocratas do Estado
antes ou depois do Muro, o brasileiro só não encontrou ainda as palavras exatas
para definir isto em que se transformou. Quem quiser que se iluda com as
peripécias dos 200 da Bovespa. A arrecadação a zero é que dá o retrato do que
estão vivendo os 200 milhões com a precisão implacável do supercomputador da
Receita Federal, que só a Nasa tem igual. Os donos do Brasil investem em drenar
o nosso bolso o que os Estados Unidos investem para conquistar o Universo, e
nem um tostão a mais, e é isso que define a relação entre “nós” e “eles” que as
nossas leis como são hoje impõem e o Judiciário exige.
Isso se chama es-cra-vi-dão.
Só o Legislativo pode mudar as
leis. E quando faz isso obriga automaticamente o Judiciário. Por isso o
Judiciário tem trabalhado com tanta fúria para comprometer a pauta do
Congresso, a flechadas, com tudo menos com reformas que toquem nas leis que
garantem a privilegiatura. Nada senão a força do povo pode destravar esse cabo
de guerra. Mas só um ataque radical e inequívoco ao privilégio apresentado
expressamente como a alternativa decente à exigência de mais sacrifícios para
manter os dos marajás intactos pode tirar o povo da sua letargia.”
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AGD comenta:
Se entendi bem o texto anterior,
ele quer dizer simplesmente que não há salvação sem o “equilíbrio entre os poderes” de nossa República. E este equilíbrio só
voltará se o Poder Legislativo começar a sair da modorra em que se encontrou
por todos os anos de cooptação pelo lulo-petismo e comece a legislar para País.
Que está em curso uma tentativa
de criminalização da política, para mim me parece óbvio. Isto não quer dizer
que a política não comete seus crimes e nem que os juízes são vestais
inocentes. Apenas significa que um depende do outro para que um sistema
democrático funcione, nos moldes que nossa Constituição impõe.
Não adianta, hoje, como diz o texto,
os juízes se basearem na Lei vigente, sem as correções necessárias dela pelos
políticos (legislativo e executivo), quando acharem isto necessário e dentro de
um prazo razoável. E hoje, com a velocidade dos acontecimentos ninguém
acompanha ninguém, quando o Brasil tem pressa.
Eu, como quase um leigo em tudo
isto, e mais 200 milhões de pessoas mais leigas do que eu, fico em dúvida
completa quando me deparo com a falta de agilidade nas decisões. Uns dizem que
a Lei vai levar o Brasil à breca (como é o caso do nosso Sistema Eleitoral), e
apresentam suas soluções. Muitas vezes belas soluções, mas esquecem que o prazo
para que elas vigorem fazem parte do problema e nunca se soluciona nada.
Tenho visto dizer que há sistemas
eleitorais incríveis mas para serem colocados em prática em 2022, e outros até
2026. É entristecedor. Será que votarei em 2026? Isto não importaria se
houvesse algo que nos incentivasse a esperar como observar os poderes trabalhando,
porém, isto é o que não vemos, e sou forçado a dizer, pela falta de equilíbrio
entre os poderes.
Como disse o autor que transcrevi
acima, isto vai se transformar numa verdadeira ditadura, seja de que forma for.
Vamos terminar preferindo uma Monarquia para agilizar a coisa. Chamem o Pedro
III.
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