Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho
Há dez anos morria um grande amigo,
lembrado hoje 24 de novembro, Erivaldo apelidado de Bico Doce. O grande amigo
morava na Rua São Vicente, na Tamarineira em uma bonita casa com varanda e
alguns pés de manga e coqueiros no quintal. Todos os sábado lá estava ele sentado no Bar
do Louro, em frente ao Hospital Agamenon Magalhaes ao lado do Colégio Santa
Catarina. Trazia sempre o tira gosto azedo para espantar o gosto da pinga
tomada durante a manhã, pitomba, laranja cravo, limão, e cada bicada lambia um
destes frutos. Logo que chegava corria para a radiola de ficha com algumas nas
mãos e colocava a musica de sua preferencia já sabida por todos os
frequentadores, Lindomar Castilho e Valdick Soriano, e ai tomava seus primeiros
goles enquanto a turma não chegava. Gostava de contar estórias mirabolantes que
não acreditávamos, mas aceitava a contra gosto, muitas das vezes mandando
parar. Ficava aborrecido. Era um sujeito alto, magríssimo, cabelo escorrido e
desalinhado, um bigode ralo embranquecido e de óculos fundo de garrafa. Ficava
chateado quando algum dos colegas vinha por trás e tirava-lhe os óculos. Ficava
uma fera, mandava todo mundo para aquele “lugar”. Não usava bermuda, dizia -
para ninguém cortejar as minhas belas pernas finas, sempre de calça frouxas e
chinelos. Quando lá para quatro horas da tarde já estava baleado, mas mesmo
assim tomava uma cerveja bem geladinha, para matar o calor e aliviar a cabeça.
Com a mão já vacilante, levava o copo à boca e como um funil fazia aquele biquinho
e por ali descia toda a cerveja do copo. Viva bico doce, dizia todos. Contava
que tinha uma namorada, no Alto do Morro da Conceição, mais nova e mais bela,
que toda sexta feira fazia ponto. Ninguém acreditava. Contava estórias inacreditáveis.
Contou que saiu do Morro da Conceição, da casa da namorada por volta das dez
horas noite. Desceu os trezentos e sessenta cinco degraus de uma só vez, foi
apenas descansar na Praça Dom Luiz, sentando-se no tamborete vermelho, tomando
uma pinga com um tira gosto de uma tripinha assada por um barraqueiro. Lambeu
os dedos e tomou outra pinga e saiu a pé pela Avenida Norte para residência
oficial. Chegando à Praça do Trabalho, encontrando uma nêga dando bola para
ele. Não se fez de rogado convidou a dita tal para uma conversa num boteco na
subida da ladeira da Mangabeira. Pediu uma cerveja e ela o acompanhou, pedindo
o tira gosto de uma galinha guisada. Conversa vai, com conversa vem, ele precisou
ir ao banheiro tirar a agua do joelho. Saiu e a nega ficou beliscando. Quando
voltou a moça de bem com a vida, chamou-o para irem a outro lugar o que não foi
aceito por estar tarde da noite. Tomou o copo de cerveja e começou a ter sono.
O sono chegou de tal maneira que ele não podia abrir os olhos. A moça
carinhosamente passou as mãos nos seus cabelos desalinhados e ali mesmo dormiu.
Acordou por volta das sete horas da manhã em bar totalmente desconhecido na
Macaxeira, onde o dono do bar nada sabia apenas ele apareceu e sentou-se e
baixou a cabeça, sem o relógio, trancelim de ouro recebido de presente da
filha, sem os óculos de grau, sem a carteira com todos os seus documentos e o
pior sem a aliança de ouro comprada a mais de trinta anos. A acompanhante disse
ao dono do bar que ali e voltava logo, o deixasse descansando. Saiu arrasado.
Nem dinheiro para o ônibus teve. Pede ao motorista à passagem que concedeu. Em
casa teve que inventar que foi assaltado por dois maloqueiros quando saia do
bar do Nego no Beco da Facada que me levaram todos os objetos de valor, pois
tinha exagerado na bebida e na conversa com os amigos, saindo por volta da
quatro e meia da manhã. Vamos à Delegacia prestar conta do roubo, disse a
filha. Não quis, pois podia receber reação dos bandidos casos fosse preso pela
Policia. Uma semana depois voltou ao bar, na Mangabeira e soube pelo dono, que
a moça lhe era desconhecida pela amabilidade que ela demonstrou pensou que
estava indo para algum motel quando chamou um taxi e colou-o desacordado no
banco traseiro e saiu. Até logo! Disse.
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