Por Carlos Sena (*)
O que dizer do Rossi? Deem-me uma
dose de uísque que eu tento. Deem-me um bom cigarro que eu tento. Pela dúvida,
deem-me uma radiola de ficha que, aí sim, eu não tento, eu digo quem é ele.
Poderei dizer que é nosso rei. Mas isso é pouco. Poderei dizer que é nosso
ícone do brega. Do brega? Sim, do brega, porque sem briga o Rossi foi a maior
tradução quer gostem as raposas, quer gostem as uvas. E que não me deixem
mentir os garçons que nas ondas dos rádios se imortalizaram pela canção. E que
não me deixem mentir os cabarés que hoje fecham as portas, descerram-na, porque
o Rossi se foi. E que não me deixem mentir as noites frias, despudoradas, porque
os botecos todos hoje fecharam mais cedo por conta do luto, do degredo abrupto
do ídolo legitimo que do povo se evadiu; que rumo às estrelas do firmamento se
foi para se confundir com elas.
O que dizer do Rei? O que dizer
da tosse alveolar que lhe calou a voz? Voz que outrora nos invadia os sentidos
com sentidos obtusos contrários à falsa moral burguesa e fedorenta. O rei catou
e foi cantado. Foi também catado. Nunca recatado, porque fazia do deboche seu
mote; do chifre um “disse-me-disse”; da cachaça uma paixão; do cigarro, pitada
de ilusão que se espalhava no ar contaminando a emoção dos pudicos e levando os
impuros aos sentimentos de ocasião e de fossa.
O que dizer do Rossi? Que
Pernambuco chora? Disso ele já sabia em vida. Porque ele tinha certeza que
“Recife era seu lugar”; que Itamaracá continua lá; que os Garçons continuam a
cantar na mesa de bar; que era Leviana a imaginação de que Reginaldo não era da
nossa elite musical... Assim, o que dizer da elite musical? Quem, neste país,
como cantor ou músico, chegaria aonde ele chegou? O Rei do brega era do naipe
do Roberto, do Caetano, do Cayme, do... O diferencial dele é que ele era raiz.
Nunca deixou de ser “batata, macaxeira”, ou o que melhor lhe servisse de ponte
para ficar perto da raiz do povo, especialmente de Pernambuco. Cantou a dor de
corno. Cantou o amor desclassificado, mas amor. Era assumidamente ele. Falava
línguas. Entendia de escala musical, compunha, fazia primorosas versões, era
amigo do Rei Roberto de quem, diante da “Raposa e as Uvas” teria ouvido ser a
música que ele gostaria de ter feito...
Assim, pra que dizer nada dele
nesta hora que ele se vai para outro plano? Melhor deixar tocar suas canções.
Melhor entender que Recife é o seu lugar. Que Itamaracá continuará sendo a
pedra que canta...
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 20/12/2013
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