Por Carlos Sena (*)
Em 2014 deixe alguém te catar. A
gente sempre manda alguém "catar
coquinho" ou mesmo com cara abusada num sonoro "vai te catar".
No ano que vem deixe que te catem, sem preconceito. Deixe catarem de vocês o
que tiver de sobra. Porque todos temos coisas boas de sobra pra dar ou vender
e, portanto se permitir a catação.
No mangue se cata caranguejo. No
namoro se cata beijo. Na reza se cata desejo. No desejo se cata: o sol nos dias
de praia; o o frio nos dias de inverno; o brilho no vestido longo, a
formalidade dentro do terno. No afago se cata o beijo, no fechecler aberto o
desejo brota qual tacape indisciplinado.
Lá fora o lixeiro cata o lixo.
Dentro de casa o lixo mesquinho do egoísmo se esconde no tapete e poucos catam.
Catapulta. Bodoque que atira a pedra que não se cata como preciosa. Precioso é
o que se nos catam na hegemonia do prazer absoluto. O pluto catando a pluta,
enquanto no meretrício baixo se catapulta por devoção ao prazer do macho.
Portanto, em 2014 cate. No final
dele ninguém irá dizer que ninguém te catou. Catou-te? Cate e se deixe catar.
Cante, porque quem canta seus cata-ventos estimulam e se desfaz o gesto frio
que separa quem tem medo de se entregar totalmente e flexamente.
Eu vi o menino correndo e não vi
o tempo atrás dele. Criança é livre e feliz porque não tem medo do chão em que
tudo cata... O tempo tem medo das crianças, mas não tem dos adultos. Porque
adulto sempre quer trocar uma coisa pela mesma coisa, mas tem medo de catar e
ser catado... Como o tempo é atrevido sempre termina nos catando. E nos
chancela com a prata nos nossos cabelos, mas cata o ouro que nem sempre se
esconde em nossos bolsos ou em nossos mealheiros.
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 13/12/2013
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