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sexta-feira, 13 de maio de 2011

Testemunhos do Vovô Zé - Mamãe passou açúcar em mim...


Um Parteira Moderna


Por Zé Carlos

Ontem e hoje, meu neto esteve aqui em minha casa. Quando isto acontece, minha função avô é ativada, embora como diz o meu amigo Roberto Lira, a multifuncionalidade para sexagenários é quase proibitiva. Então fica em cena só o Vovô Zé. O Davi veio com os seus pais para, entre outras coisas, comprar o enxoval do seu irmãozinho Miguel que nascerá lá pelo mês de julho.

É uma incógnita até hoje, saber como o Davi reagirá à chegado do Miguel proximamente. Todo dia são escritos textos e mais textos tentando decifrar o que sente uma criança bem pequenina com a chegado do irmão, numa idade em que quando se chega à idade adulta não há muitas lembranças para preencher o vácuo do conhecimento gerado pelos outros.

Eu tive um irmão quando tinha menos de 2 anos de idade. Não me lembro de nada, a não ser aquilo que foi contado pelos que vivenciaram meus momentos. Inclusive, o que me foi contado foi muito triste. Meu primeiro irmão que se chamou Pedro Hélio, morreu antes de completar um mês. Coisas de quando o nosso sistema de saúde se resumia ao Dr. França, comadre Geracinda e talvez ao Joaldi. Não me lembro. Minha família, pelo menos durantes os três primeiros partos de minha mãe, nunca chamou médico. Talvez meu pai não pudesse pagar ou mesmo pelo costume de em primeiro lugar chamar a parteira. A comadre Geracinda foi a primeira pessoa que vi e não me lembro. Foi quem fez o meu parto. A partir do quarto filho, meu pai já chamava a comadre Gilda de seu Abelardo para aplicar uma injeção de “pituitina” (Desculpem se o nome não era este, minha rede neuronal agora só funciona com a “grande rede”. Por exemplo, estou há uma hora tentando me lembrar do nome da mãe do amigo Beto Guerra e não consigo, mas sei que também era parteira das boas e até sabia aplicar injeção, também. Seria D. Dulce?).

Seria muito chato ficar contando aqui os detalhes do meu parto como vistos por outros e contados de geração em geração até chegar aos meus ouvidos. Não vou dizer aqui que nasci numa manjedoura, onde pastavam jumentinhas, cabritinhas e vaquinhas, para depois virem dizer que estou tentando alavancar a audiência do blog, explorando animais. Não. Isto eu não faço. Digo apenas o que é mais inusitado.Como por exemplo, nasci dentro de um forno. Não sei nem se ainda hoje existe este forno, que antes pertencia ao meu avô, depois a um tio meu, numa padaria chamada Padaria Cordeiro, na Praça Lívio Machado. Pois é meus amigos. O quarto onde eu nasci era exatamente o local, onde depois foi o tal forno, que fez parte de uma modernização do processo produtivo do pão feito pelo meu tio, que foi um grande empreendedor. Meu pai era o seu padeiro.

Não conto isto para que depois o público feminino diga que eu sou um pão e que sou quente por esta circunstância histórica. O Roberto Lira está mais uma vez dentro dos meus padrões quando diz que os hormônios estão em farrapos, e nem adianta ouvir mais elogios assim. Escrevo apenas para justificar a estória que eu ouvi ao nascer, e que justifica porque eu gosto tanto do Davi, com o vice-versa mais verdadeiro ainda. E não sou só eu. Penso que isto acontece com todo avô, mesmo aqueles que aparentam serem turrões e super-educadores, ao contrário de mim que sou apenas um corruptor de netos.

Não conheci o meu avô materno. Conheci apenas o paterno. Se durante toda a vida ele trocou 5 ou 6 palavras comigo, eu já acharia muitas. Talvez 5 delas eram usadas no final do ano, pelo natal, quando ele me chamava, tendo na mão uma moeda de dois mil réis, e dizia, tome, não vá gastar com besteira! Mesmo assim, talvez porque eu ficasse esperando as moedas o ano todo, eu tinha o maior respeito por ele.

Hoje o respeito que o Davi me tem é imenso, e eu fico contentíssimo com isto. Sua mãe fica mesmo até um com um pouco de ciúme, quanto ele me chama de “vovô bobão” e me faz de cavalo todo o tempo. É eu deitar no chão e ele montar, dizendo “vamos cavalão”, enquanto eu rio e me divirto com todo aquele respeito, um tanto diferente daquele que eu tinha com pelo meu avõ, embora tenha certeza ele ficava tão alegre com o meu respeito como eu com o do Davi. O que acontece é que as coisas mudam com as pessoas, com o tempo e com os lugares, mas avô é sempre avô e neto sempre neto. E as mãe são sempre mães e ficam com um ciúme danado, do amor do neto pelos seus pais.

Resolvi então contar para vocês uma história que se passou comigo, quando eu nasci dentro daquele forno de padaria, mostrando que sou um pão, e naqueles momentos descobri que poderia se um pão doce.

Minha parteira andava de um lado para o outro, e já fazia quase três dias, que minha mãe, tendo seu primeiro filho, eu, sofria, segundo ela para pagar o pecado original, e pelo que ela passou eu é que deveria continuar pagando este pecado. Quando meu pai dava algum sinal de aflição, comadre Geracinda dizia:

- Tenha fé em Deus, compadre, está nas mãos Dele!

E entre uma pitada de cachimbo e outra, continuava sua andança. Até que em determinada hora minha cabeça adentrou no mundo onde ainda se encontra, vi a cumadre geracinda, não tive medo, não chorei a não ser depois de umas palmadas que ela me deu, e a ouvi dizer, depois de me limpar um pouco:

- Compadre, me dê ai o talco!

- Não tem talco não, comadre, a senhora não mandou comprar!

Respondeu meu pai. Já menos angustiado. E ouvindo da comadre:

- Então me dê um pouco de açúcar!

Meu pai trouxe um açucareiro inteiro e a comadre Gerancinda passou açúcar em mim. Sobrevi e estou aqui contando esta história verdadeira, e ouvida com meus ouvidos recém nascidos e com estes olhos que algum dia a terra há de comer.

Contei-a aqui para que aqueles avós que tiverem filhas bem ciumentas como a minha, possam justificar o amor que os netos tem por ele. Depois de muito tempo de contar a história por muitas vezes um cara aproveitou e compôs uma canção que diz num refrão:

“Eu era neném
Não tinha talco
Mamãe passou açúcar em mim....”

Estes compositores deturpam tudo...

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