Por Zé Carlos
Uma mau hábito sempre permeou minha vida, desde que pude me apossar de um aparelho de televisão e usá-lo como gosto, sem interferências. Isto só ocorreu quando pude comprar um. É uma mania que tenho de comer vendo TV. Tentei educar minhas filhas, com o velho argumento, do “faço o que digo mas não faça o que faço”, que isto era um péssimo procedimento. Neste caso, este dizeres, mentores da hipocrisia, deram resultado. Minhas filhas não ficaram com este mau hábito. Embora, me fizeram uma grande chantagem para assim proceder. Fizeram-me prometer que deixaria de fumar. Esta chantagem me deu a sobrevida que gasto usando estas teclas.
O mau deste comportamento hoje se revelou de uma forma drástica. Fui almoçar e liguei a televisão. Quase passei mal. Não comi direito e se o tivesse feito teria certamente uma bruta indigestão.
Vejo e ouço a notícia. Um rapaz de 24 anos, de posse de dois revólveres e vários carregadores automáticos, entrou em sua ex-escola e matou mais de 10 crianças, ferindo várias outras, com tiros de precisão em suas cabeças e seus tóraces, o que mostra a premeditação do crime, reforçada pela roupa que vestia. Após usar toda a munição, restou alguma para se ele se matar.
O que pensei de imediato, mesmo com a seriedade do ocorrido, foi: Que país é este? Mais uma tragédia no país de Obama. Engoli seco, aticei as oiças e continuei vendo aquele monte de repórteres que comparecem sempre quando há acontecimentos do tipo. Apurei a vista e não vi aqueles guardas de negro e aquelas ambulâncias reluzentes típicos dos americanos, com aqueles cordões de isolamento, que tanto vimos lá nos massacres de outras escolas. Notei uma paisagem mais de perto, e por mim, pessoalmente conhecida. Então veio a surpresa. O local da tragédia era uma escola em Realengo, bairro do Rio de Janeiro.
Eu já estive lá um dia, talvez por algumas horas, mas não a ponto de fixar todos os detalhes daquele bairro. A única coisa que me lembro, é que quando, nas estações quentes, no verão brabo do Rio, o homem ou a moça do tempo sempre dizia que a máxima era em Realengo ou em Bangu.
Fiz o que pude em termos de alimentação e fiquei, boquiaberto, vendo a extensão de uma tragédia, deste porte. É uma escola inteira, um bairro inteiro, uma cidade inteira, um estado inteiro, um país inteiro, e talvez o mundo, diante do imponderável. Nestas horas, nossa tendência é procurar culpados. Excessos de armas de fogo, dizem uns. Falta de religião dizem outros. Excesso de liberalidade, outros. Falta de segurança pública, uns mais na frente. Foi o FHC. Foi o neoliberalismo. Eu não disse que não voltasse em Dilma! O Obama veio aqui para ensinar ao assassino. Yanques, go home! O culpado foi o computador. Foi a imprensa. E por ai vai.
Neste mundo que prega sempre uma relação de causa e efeito entre os fenômenos, ficamos escravos das explicações lógicas. Mas, muitas vezes o modelo explicativo não é este. Às vezes os acontecimentos não têm causa, e se as tem, não está ao nosso alcance encontrá-las. E nestes casos simplesmente, os fatos acontecem. Sua explicação trazem mais angústia do que paz de espírito. Ficamos iguais a formigas quando pisamos no seu formigueiro. Uma parte morre e a que fica tenta explicar, e não conseguem, a origem do “pesão”.
Então eu me calo por aqui, triste e macambúzio ao pensar, o quanto eu gostaria de explicação se lá tivesse um meu filho ou um meu neto. Será que eu a encontraria. Só posso dizer como minha mãe dizia nestas horas. “Meu filho lá!? Deus me livre e guarde!” Que grande egoísta e impotente eu sou diante de fatos como estes. Mas o que fazer?!
Eu já prometi a mim mesmo que tentarei parar com o meu triste hábito. Não comerei mais vendo a TV. Chega de tragédia.
AGORA, SÓ FALTA MESMO O TERREMOTO PARA SERMOS UMA PÁTRIA COMPLETA...
ResponderExcluirCaro Zé Carlos,
ResponderExcluirUm belo texto. Emoção do tamanho da tragédia e pieguice do tamanho da sanidade mental do assassino. Você escrevendo duas vezes por dia, nem eu acreditaria se me contassem.
Um abraço da amiga
Lucinha