“Civilização ou
barbárie
POR FERNANDO
HENRIQUE CARDOSO
Passei as duas
últimas semanas em Lisboa e Londres. Vi pela mídia a indignação provocada pelo
assassinato de Marielle Franco, vereadora que denunciava abusos contra os
direitos humanos no Rio de Janeiro.
Dizer que se
tratou de mais um assassinato é não entender o recado que quiseram dar os que a
mataram. A intervenção militar na Segurança Pública do Rio não foi devidamente
preparada e não soluciona todos os males, mas é vista como uma ameaça real pela
banda podre das forças policiais, pelas milícias e pelas organizações
criminosas. Os autores do crime quiseram deixar claro que o poder ilegal está
disposto a tudo para preservar seus domínios. É sinal de uma escalada.
Na Colômbia,
entre as décadas de 70 e 90, o crime organizado foi de ousadia em ousadia até
assassinar um candidato a presidente da República e explodir um avião de
passageiros. No México há mais de dez anos se vive uma guerra que não poupa
jornalistas, políticos, policiais, militares e cidadãos comuns. Ano passado, o
país teve a maior taxa de homicídios já registrada.
O assassinato
de Marielle é um alerta. Deve-nos fazer lembrar que está em jogo a
possibilidade ou não de avançar na construção de uma sociedade decente no
Brasil. Nos últimos 30 anos muita coisa mudou para melhor. Menos os índices de
violência. E isso se deve em larga medida à expansão do crime organizado. A
escalada da violência põe em risco a própria democracia.
Não é uma
questão partidária ou mesmo ideológica. Os que mataram a vereadora, assim como
os assassinos da juíza Patrícia Acioli, em 2011, e de centenas de policiais nos
últimos anos no Rio de Janeiro, não são de esquerda nem de direita, são
bandidos. E bandidos organizados em poderes paralelos que se impõem pela
violência e pela corrupção. Os mais pobres, que não têm meios para se proteger
da sistemática violação dos mais elementares direitos humanos, são suas maiores
vítimas.
Senti de perto
o drama vivido pelas populações das favelas cariocas quando participei do
documentário Quebrando o Tabu. Elas vivem entre o fogo cruzado de grupos
criminosos rivais. Apesar disso, não veem na polícia uma aliada. Quando esta
sobe o morro – contou-me uma mãe com um filho traficante e outro, não –, todo
mundo apanha. O filme põe em discussão a chamada guerra às drogas, que em
vários países tem sofrido críticas e propostas de mudanças por não reduzir o
consumo de entorpecentes e aumentar a violência.
A comoção
provocada pela morte de Marielle dá esperança de ser possível reunir pessoas e
forças sociais diversas em torno do objetivo comum de reduzir com urgência a
violência no Brasil. Devemos colocá-lo acima dos interesses e paixões
eleitorais e condenar a exploração política rasteira do episódio. É muito
perigosa a mistura de ódio político, violência cotidiana e demagogia.
O momento pede
coesão em torno de valores: firmeza no combate ao crime, mas dentro da lei;
ordem, sim, mas dentro da democracia. A polícia deve estar bem armada, não a
sociedade. Que o digam os milhões de jovens americanos que, depois de
sucessivos mass shootings, foram às ruas no último fim de semana protestar
contra a facilidade de acesso a armas nos Estados Unidos.
Sem coesão em
torno de determinados valores, o que esperar do futuro? O País vive uma
disjuntiva: podemos reconhecer os males que nos afligem – e a escalada da
violência é um dos maiores, se não o maior – e estabelecer políticas que
reduzam ou eliminem esses males, ou nos deixar dominar pelo espírito de facção
e lançar o País à deriva. Sem catastrofismos nem exageros, o risco existe.
Não falo como
homem de partido, mas como brasileiro: o Brasil precisa de lideranças que
tenham a capacidade de reunificar o País em torno de alguns objetivos comuns.
Se em outubro o País se deixar levar pelo ódio, o que será de nós como
“comunidade nacional”? Não pode haver comunidade nacional bem-sucedida sem
crença na importância da convivência política civilizada, sem recuperação da
confiança na democracia, sem a prevalência da ordem dentro do Estado de
Direito.
É urgente
recuperar a autoridade pública. Mas autoridade derivada da legitimidade das
urnas, da capacidade de governar para o País em seu conjunto, da exemplaridade
da conduta, da compreensão de que o Brasil requer tanto mais eficiência
econômica quanto mais justiça social, tanto mais ordem quanto mais democracia,
tanto mais eficácia no combate ao crime quanto mais respeito aos direitos
humanos.
Nas
circunstâncias atuais, a eleição do futuro presidente se torna agônica. Que ele
ou ela seja não só expressão de um sentimento, mas líder competente para governar.
Que saiba que o Estado deve estar a serviço da sociedade, e não de grupos ou
partidos políticos. Que valorize a Federação e convoque governadores e
prefeitos a se engajar nas grandes causas nacionais. Que respeite o Congresso,
mas seja capaz de conduzi-lo e, obediente às leis, não tenha medo de buscar
reformá-las quando inconsistentes com as necessidades do País.
Cada um de nós
tem a responsabilidade de ajudar o eleitor a distinguir entre a demagogia e a
proposta consistente, entre informação e fake news, entre compromisso com
valores e políticas e truques de marketing. A ansiada renovação de conduta deve
ter início na campanha e se traduzir num novo governo capaz de fazer o País
recuperar a confiança no seu futuro.
Caso contrário,
temo, podemos enveredar por descaminhos que, cedo ou tarde, nos levem a
governos não democráticos, de direita ou de esquerda. A história dos últimos 20
anos mostra que a democracia pode morrer sem que necessariamente haja golpes de
Estado e supressão de eleições. Ela morre quando grupos e líderes políticos se
aproveitam do rancor ou do medo do povo para sufocá-la pouco a pouco em nome da
grandeza da pátria, da revolução ou do combate à desordem.
Nossa maior
arma contra esse risco é a palavra e o voto. Façamos bom uso dela.”
-------------
AGD
comenta:
Ontem
foi o “primeiro de abril”, também chamado o dia da mentira. O texto que escolhi
para transcrever hoje, como vocês viram, é do FHC. Sigla que se tornou um pouco
sinônimo de mentira desde a pregação do PT, o maior fazedor de fake-news do
nosso país, ainda hoje.
Eu
sei e concordo que a linha ideológica do partido por ele criado, o PSDB, pela
sua aproximação com as esquerdas, era o “cão chupando manga”. No entanto,
o FHC serviu de contraponto às esquerdas menos civilizadas, nos livrando delas
por muitos anos.
Infelizmente,
veio o Lula e levou tudo à breca com sua capacidade de fazer política em causa
próprio e pelas próprias condições econômicas do mundo, no tempo em que ele e
seu partido governaram. E depois veio o seu “poste” a Dilma, que foi o que de
mais ineficiente se pôde verificar na história deste país.
Hoje,
caindo na nossa realidade, com a bagunça generalizada pelos 3 poderes da
república, o dito acima por FHC ainda é um alento para não cairmos de vez na
barbárie, se já não caímos, quando nosso Supremo tratou o Lula como alguém mais
igual do que os outros, deixando ele passar a Páscoa com a família, quando seu
lugar, pelas leis da república, seria junto com os outros criminosos, ungidos
pela corrupção.
E nesta
semana, quando o STF volta a se reunir para ver se solta ou prende o Lula de
vez, o que devemos fazer para que o povo brasileiro dê sua contribuição para
que não caiamos na barbárie? Eu diria que, apenas nos tornando povo e lutando pela
democracia e pelo estado de direito, que já nos custou tanto.
E a
forma mais correta para fazer isto é cumprindo nossa obrigação indo às ruas e
nos manifestando de forma pacífica e ordeira, com um olho no voto e outro nos
gatunos de plantão.
Vamos
às ruas então, no dia 3, e o Brasil agradecera´.
Nenhum comentário:
Postar um comentário