“Cair na real
Por Zeina Latif
Em meio a doses de desânimo em relação ao quadro econômico,
muitos questionam quando será possível uma arrancada do crescimento. A resposta
passa pela compreensão do porquê o Brasil está estagnado.
Fazer diagnósticos não é tarefa fácil e há muitas
divergências entre os economistas. Alguns dão mais peso a choques de curto
prazo, como a Argentina ou a greve dos caminhoneiros no ano passado. No
entanto, estivesse a economia mais sólida, choques adversos teriam impacto mais
modesto e transitório.
Outros apontam para a mudança da política econômica nos
últimos anos, com o corte dos gastos públicos e do crédito dos bancos estatais.
Seria como uma crise de abstinência pela falta dos impulsos econômicos
promovidos no passado, sem uma compensação tempestiva do setor privado.
Sem dúvida, há setores que sentem bastante o menor
protagonismo estatal, como a construção civil. O segmento habitacional, por
exemplo, sofre com o encolhimento do Minha Casa Minha Vida, que era responsável
por mais de 70% da oferta de moradias. Vale também colocar na conta os grandes
projetos de infraestrutura. Ocorre que foi a mudança do regime de política
fiscal que permitiu taxas de juros do Banco Central inéditas no País,
produzindo a recuperação paulatina do crédito e o crescimento do mercado de
capitais.
Ainda que esses fatores acima possam ser relevantes para
compor o quadro de estagnação, não seriam a razão principal para a fraqueza da
economia. A importância excessiva dada a eles acaba sendo justificativa para a
defesa de estímulos de curto prazo, como a liberação do FGTS.
É crucial, porém, que essas políticas estejam inseridas em
um contexto mais amplo de reformas estruturais, para evitar desperdício de
recursos e de tempo. Isso porque o grande problema da economia brasileira é
estrutural, com encolhimento do potencial de crescimento. Pelas estimativas do
economista sênior da XP, Marcos Ross, ele seria atualmente ligeiramente
inferior a 1%, ante em torno de 3,5% na média das gestões FHC e Lula.
Foram muitos recursos públicos gastos de forma ineficaz,
como o crédito subsidiado para setores que poderiam acessar o mercado de
capitais e sem impor contrapartidas de metas de investimento; renúncias
tributárias setoriais, em vez de se promover a inovação e o treinamento da mão
de obra para todos os setores; projetos questionáveis de infraestrutura, etc.
Além disso, houve aumento da insegurança jurídica, em função das frequentes
mudanças de regras do jogo, como na tributação e em regulações de setores. O
resultado é a infraestrutura insuficiente e deteriorada, mão de obra pouco
qualificada, parque produtivo obsoleto e problemas de gestão das empresas, que
sofrem com o custo Brasil.
Os problemas não param aí. O difícil ambiente de negócios
gera distorções na estrutura produtiva, pois é barreira natural para entrada de
novas empresas em muitos setores e ameaça as médias empresas existentes. O
resultado é a maior concentração nos setores, prejudicando os consumidores.
Além disso, estimula-se a informalidade, reduzindo a produtividade da economia.
Há analistas que depositam excessivo otimismo no avanço das
reformas. Um ambiente econômico estável contribui certamente para o avanço da
agenda econômica (gastamos tempo demais discutindo a taxa Selic), mas não é
automático. É necessário esforço reformista, o que não é fácil. Basta notar as
idas e vindas de anúncios do governo, como a redução das tarifas de importação
de bens de capital e informática. E não será uma reforma sozinha que permitirá
a aceleração do crescimento ao menos para o patamar mundial (3,5%), como no
passado. Não há bala de prata.
Vamos encarar os fatos. Não há milagre para gerar uma
arrancada de crescimento. A fraqueza da economia não é conjuntural e
transitória, mas sim estrutural.
Caberá ao governo Bolsonaro avançar na agenda de reformas,
com a ingrata realidade de que o grosso do benefício poderá ficar para uma
próxima administração.”
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