A semelhança entre Brasil e Argentina
Por William Waack
É quase irresistível a tentação de dizer que Argentina e
Brasil são espelhos de si mesmos. Os dois vizinhos tiveram seus populistas
históricos cujas sombras políticas se projetam até hoje (Peron e Vargas).
Desenvolveram Estados balofos que extraem desproporcional parte da riqueza
gerada nos respectivos territórios – sem terem sido capazes de conduzir as respectivas
economias para crescimento em bases sustentáveis. A Argentina era rica e ficou
pobre, e o Brasil não conseguiu ficar rico.
Há notórias diferenças, até anedóticas. O argentino tende a
assumir que o melhor ficou no passado, enquanto o brasileiro acha que o melhor
estará no futuro. Ainda assim há grandes paralelos na linha do tempo entre os
dois países. Brasil e Argentina experimentaram rupturas políticas em épocas
muito próximas, passaram por ditaduras militares e “guerras sujas” de feições
similares (ainda que de diferentes intensidades de trauma e violência),
voltaram a regimes civis em períodos simultâneos, arcaram com graves crises de
endividamento, recessão e, mais recentemente, com regimes de grotesca
irresponsabilidade fiscal, em boa parte culpados diretos pelas dificuldades
econômicas que ambos enfrentam.
Significa que o fracasso do governo argentino em implementar
reformas econômicas estruturantes e, como consequência, a provável derrota
eleitoral de uma proposta de liberalização da economia – e a volta pela urna ao
descalabro de um regime populista de “esquerda” – é o espectro que ronda o
Brasil? Claro que jamais se pode excluir o que ainda não aconteceu, assim como
não se pode confiar na inevitabilidade do que virá, mas há algo que torna os
destinos de Brasil e Argentina tão parecidos: é um desafio comum que não
conseguiram resolver.
O ciclo que enfrentam os dois gigantes sul-americanos,
abundantemente dotados de recursos naturais e em confortável posição
geográfica, é de como driblar o que economistas chamam de “falta de
convergência” da grande maioria dos países emergentes em relação aos países
mais avançados. Por “falta de convergência” entende-se a incapacidade de
economias de renda média de reduzir a diferença que as separa há décadas do
rendimento per capita de países avançados.
Quando os Brics surgiram, há quase 20 anos, parecia que os
emergentes iriam, finalmente, alcançar os países do topo. Mas hoje se afirma
que a “convergência” era sobretudo o efeito China (e Índia também) e do
superciclo das commodities – dois fatores que não se repetem em prazos
históricos curtos. Números cruéis estão aí para indicar que Brasil e Argentina
continuam tão distantes dos mais ricos como estavam há uma geração, e pior:
estão sendo alcançados por vizinhos, como Peru e Colômbia, que sempre foram
consideravelmente mais pobres.
É vastíssima a literatura que se ocupa dessa questão, a da
superação da pobreza. Tirando o submarxismo típico de baixa produção
intelectual que atribuía o atraso relativo de Argentina e Brasil a alguma
malvada “imposição” de interesses externos, consolidou-se nos últimos anos o
consenso de que escolhas políticas, travas internas, problemas domésticos e,
principalmente, ausência de líderes comprometidos com um horizonte de longo
prazo é que ajudam a entender as dificuldades de ambos para sair da presente
estagnação econômica e resolver problemas tão básicos como pobreza e gritante
desigualdade – as mesmas mazelas de sempre, agora agravadas por índices
inéditos de violência.
A história recente demonstra que governos da chamada
“esquerda” na Argentina e no Brasil não resolveram nenhum dos problemas
fundamentais desses países – ao contrário, contribuíram para piorá-los. Os de
“direita” precisam provar que conseguem.”
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