“Gradualmente, e
aí, de repente
Por Silvio Meira
Tim O’Reilly
abre um de seus textos com um personagem de Hemingway respondendo como faliu:
“gradualmente e, aí, de repente”. É também uma descrição de como o futuro
aparece. Ele chega “gradualmente (por muito tempo, quase sempre) e, aí,
acontece de repente”. É por isso mesmo que quem não presta atenção em sinais
fracos acha que o futuro, qualquer um, chega de uma hora pra outra.
Não foi num só
dia que os pagamentos móveis na China saíram do zero para US$30 trilhões por
ano. Não é observando os EUA, onde o mesmo tipo de transação está nas dezenas
de bilhões por ano, que se vai entender o futuro deste mercado. O futuro não é
só um tempo, é um contexto, que envolve lugares, suas regras e possibilidades,
suas fundações e potencial. Por isso que, mesmo surgindo na África nos anos
2000, o formato africano de “dinheiro digital móvel” não se tornou global.
Não acho que
muita gente duvide, hoje, que os veículos do futuro serão autônomos. Também não
conheço quem acredita que eles serão ubíquos de uma hora pra outra. Porque
ainda há muita coisa pra acontecer antes de haver carros sem motorista rodando
em Taperoá, na Paraíba. Isso vai ocorrer muito mais rapidamente nuns lugares do
que noutros; o futuro, mesmo quando chega de repente, não chega em todo canto
ao mesmo tempo, nem pra todo mundo.
Mesmo quando se
considera serviços públicos, que deveriam ser universais, o tempo é um
problema: a rede elétrica começou em 1881 no Reino Unido e serve 86.8% da
população mundial. Mais de 130 anos depois, há 13% da população sem acesso a
eletricidade. Por quê? Contexto – ou falta dele. A internet comercial apareceu
há 25 anos e atende 51.3% da população mundial. Em que futuro será universal?
Com as taxas de adesão à rede caindo como estão, não será antes de 2050.
Danado.
Mas o futuro não
é só “gradual e de repente...” quando em tecnologias e seus usos. O trabalho,
em transições provocadas pelas transformações tecnológicas, muda lenta e, aí,
radicalmente. E isso está ocorrendo agora, com muitas empresas sem saber o que
está acontecendo e, entre as que imaginam que sabem, como tratar o futuro do
trabalho e as pessoas que são responsáveis por ele. Porque empresas são
abstrações; os negócios que elas fazem são redes de pessoas, que trabalham.
O trabalho gasta
100 mil horas de uma vida e seu presente e futuro já passam por mudanças
rápidas e radicais. Isso levou a NASA a criar um arcabouço para que suas
pessoas se tornem adaptáveis, resilientes, produtivas e ousadas, para enfrentar
o “de repente, todo dia”. Nem todos os negócios têm que pensar da mesma forma
que a NASA, claro, mas todos têm que redesenhar seus processos e métodos, suas
arquiteturas de criação e entrega de valor, no contexto do presente e futuro do
trabalho das suas pessoas. Bem, nem todos: só os que – de repente – querem ter
algum futuro...”
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AGD
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