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sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Gradualmente, e aí, de repente





“Gradualmente, e aí, de repente

 Por Silvio Meira

Tim O’Reilly abre um de seus textos com um personagem de Hemingway respondendo como faliu: “gradualmente e, aí, de repente”. É também uma descrição de como o futuro aparece. Ele chega “gradualmente (por muito tempo, quase sempre) e, aí, acontece de repente”. É por isso mesmo que quem não presta atenção em sinais fracos acha que o futuro, qualquer um, chega de uma hora pra outra.

Não foi num só dia que os pagamentos móveis na China saíram do zero para US$30 trilhões por ano. Não é observando os EUA, onde o mesmo tipo de transação está nas dezenas de bilhões por ano, que se vai entender o futuro deste mercado. O futuro não é só um tempo, é um contexto, que envolve lugares, suas regras e possibilidades, suas fundações e potencial. Por isso que, mesmo surgindo na África nos anos 2000, o formato africano de “dinheiro digital móvel” não se tornou global.

Não acho que muita gente duvide, hoje, que os veículos do futuro serão autônomos. Também não conheço quem acredita que eles serão ubíquos de uma hora pra outra. Porque ainda há muita coisa pra acontecer antes de haver carros sem motorista rodando em Taperoá, na Paraíba. Isso vai ocorrer muito mais rapidamente nuns lugares do que noutros; o futuro, mesmo quando chega de repente, não chega em todo canto ao mesmo tempo, nem pra todo mundo.

Mesmo quando se considera serviços públicos, que deveriam ser universais, o tempo é um problema: a rede elétrica começou em 1881 no Reino Unido e serve 86.8% da população mundial. Mais de 130 anos depois, há 13% da população sem acesso a eletricidade. Por quê? Contexto – ou falta dele. A internet comercial apareceu há 25 anos e atende 51.3% da população mundial. Em que futuro será universal? Com as taxas de adesão à rede caindo como estão, não será antes de 2050. Danado.

Mas o futuro não é só “gradual e de repente...” quando em tecnologias e seus usos. O trabalho, em transições provocadas pelas transformações tecnológicas, muda lenta e, aí, radicalmente. E isso está ocorrendo agora, com muitas empresas sem saber o que está acontecendo e, entre as que imaginam que sabem, como tratar o futuro do trabalho e as pessoas que são responsáveis por ele. Porque empresas são abstrações; os negócios que elas fazem são redes de pessoas, que trabalham.

O trabalho gasta 100 mil horas de uma vida e seu presente e futuro já passam por mudanças rápidas e radicais. Isso levou a NASA a criar um arcabouço para que suas pessoas se tornem adaptáveis, resilientes, produtivas e ousadas, para enfrentar o “de repente, todo dia”. Nem todos os negócios têm que pensar da mesma forma que a NASA, claro, mas todos têm que redesenhar seus processos e métodos, suas arquiteturas de criação e entrega de valor, no contexto do presente e futuro do trabalho das suas pessoas. Bem, nem todos: só os que – de repente – querem ter algum futuro...”

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