“Voto e realidade
Por Zeina Latif
O Brasil vem passando por testes
de maturidade. Primeiro, os protestos iniciados em 2013. A inflação elevada e a
fraqueza da economia geravam desconforto. A sociedade desconfiou que havia algo
errado, antes da classe política.
O segundo teste foi o
impeachment. A ex-presidente recebeu um “cartão-vermelho” da sociedade por
provocar a mais grave crise da nossa história. O grito “Fora Dilma” foi mais
alto do que o discurso do “golpe”.
O terceiro foi o governo do MDB
promover uma reorientação da política econômica e avançar com reformas
estruturais, em vez de adotar atalhos, como aumentar a carga tributária.
O quarto teste foi o silêncio das
ruas. Mesmo na greve dos caminhoneiros, não houve “Fora Temer”. Sinal de que a
sociedade tem apreço pela estabilidade da economia, apesar de não gostar do
presidente.
Muitos outros testes virão, tendo
em vista os desafios a serem urgentemente enfrentados. Temos adiante o teste da
campanha eleitoral. Os sinais preocupam, pois cresce a polarização. Mas nem
tudo está perdido.
As respostas da política ao
infeliz ataque a Bolsonaro e à inviabilidade da candidatura de Lula são mistas.
Muitos buscam a moderação, mas sobra insensatez nas falas de membros da
campanha de Bolsonaro e do PT. Até o comandante do Exército derrapou. São
posturas desrespeitosas com o eleitor e que alimentam o “nós contra eles”.
Moderação e comedimento são para
os bons, para aqueles que compreendem que as fissuras no País reduzem nossa
capacidade de avançar. A alguns players políticos falta a necessária contenção
do jogo democrático.
As pesquisas eleitorais recentes
não foram muito claras. Não sugerem, no entanto, um clima de comoção cega no
País, pois não houve mudança estatisticamente relevante nas intenções de voto
em Bolsonaro. A questão não é votar ou não no candidato, mas fazê-lo pela razão
correta, e não por conta do triste episódio. Tampouco a transferência de votos
de Lula para Haddad se mostra automática, apesar do discurso petista de que um
é “enviado” do outro.
O teste da eleição será para
todos. A imprensa ajudando o eleitor a conhecer os candidatos, ao questionar
sobre suas propostas e sua capacidade de entrega. E a política respeitando as
regras do jogo, fazendo críticas honestas a seus rivais e expondo suas
propostas. É essencial haver ética na campanha.
As pesquisas qualitativas mostram
que o eleitor mediano, ou seja, aquele que melhor espelha a sociedade, é
moderado, de centro, aprecia candidatos experientes, não gosta de agressões e
busca um presidente com postura firme, mas não um “salvador da pátria”, como o
fez em 1989, quando elegeu Collor.
Não à toa as candidaturas do
centro são as que mais somam intenção de voto: em torno de 30% do total (inclui
brancos, nulos e indecisos), incluindo Marina, Alckmin, Álvaro Dias, Amoêdo e
Henrique Meirelles.
Aqui há uma grande complicação: a
dispersão das candidaturas do centro poderá levar à polarização no segundo
turno. Assim, o resultado eleitoral refletiria o desejo de uma minoria, e não o
da maioria, que seria o desejável.
Os candidatos dos extremos somam
hoje menos de 40% dos votos, o que significa que o presidente eleito em um
pleito polarizado teria perdido a eleição de um candidato do centro no segundo
turno. Uma aberração. Esse risco aumenta a responsabilidade dos políticos do
centro. Quem quer que seja o vitorioso em um segundo turno polarizado, vai
precisar construir pontes com a maioria restante da sociedade. Com a sociedade
mais exigente, o esforço terá de ser maior, e passa pela capacidade de fazer o
País voltar a crescer. Tremendo desafio.
Que a campanha eleitoral consiga
potencializar as características do eleitor mediano, e não provocar a fúria. É
a melhor forma de permitir que o resultado final reflita mais fielmente os
anseios da sociedade, de forma a se reduzir o risco de decepções no futuro.
Fúria e comoção não são boas
conselheiras.”
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