Por Carlos Sena (*)
Verdadeiros amigos se contam nos
dedos. Talvez nem se precise usar os dez dedos das mãos, porque os amigos
verdadeiros são poucos, mas não são
minguados. Compreender uma amizade é muito simples. Manter uma amizade também
assim se pode dizer. Entre compreender e manter existem liames interessantes. A
gente compreende um amigo quando, sempre que é preciso, lhe dizemos verdades
que ele precisa ouvir, não aquelas que ele gostaria, no seu conforto, de
escutar. Manter um amigo é dizer essas verdades sem ferir, mas primando pela legitimidade
da situação.
Não se deve maquiar uma relação de amigo.
Maquia-se relação de conhecidos que se conhecem em defesa de interesses
diversos, menos o de amigo. Muitas vezes um amigo de verdade só olha e já diz
tudo que precisa ser dito. Ou escutado, porque a recíproca tem que existir,
senão o sentido da amizade se perde no infinito.
Compreender um amigo passa por
não cobrar dele nada, muito menos sua presença no dia do seu aniversário. Ele
pode faltar nesse dia, inclusive porque ele nunca falta em muitos outros dias
em que não há solenidades a ser comemoradas. Compreender é, pois, a base para a
manutenção de uma grande amizade. Neste sentido, pode-se observar que uma
amizade verdadeira pode ser testada, principalmente, quando, além de não se
fazer cobranças, não existe hiato de tempo quando amigos se encontram. Dito
diferente, a gente passa meses, até anos, sem ver um grande amigo, mas quando a
gente se encontra a pessoa tá ali, do mesmo jeito. Dá-nos a impressão de que
convivemos diariamente com ele (ou ela) e que nunca houve, de fato, distancia.
Por isso que verdadeiros amigos
não se contam nos dez dedos das mãos. Pode ser que um amigo verdadeiro tenha
mesmo o valor de dez. Sendo assim, melhor ter um só amigo que valha por dez, do
que dez que não nos serve, sequer, para uma prosa em mesa de bar. Assim, quem
tiver um amigo nessas configurações, cuide. Esse cuidado é fácil, mas requer
atenção. Porque amigo de verdade a gente não usa para certas coisas que mais
poderão acabar com a a amizade do que mantê-las. A função do amigo é a amizade.
Dinheiro emprestado a gente pede a banco. Pra ser fiador? Não precisa, pois
aluguel de casa hoje tem uma caução que evita esse desconforto. Amigo é pra
chorar em nosso ombro e nós no dele. É pra gente ficar preocupado quando sabe
que está doente e que se for preciso, faremos doação de sangue para vê-lo bem.
Amigo verdadeiro não precisa de nós, nem nós dele. A única precisão necessária
aos amigos e às amizades é a imprecisão expressa no "nada cobrar do
outro", senão deixa de ser amizade e passa a ser negócio. O lado avesso
disso tudo é a tristeza que a gente sente quando um amigo se afasta de nós sem
nos dizer os motivos. Certamente, ora diremos: quem deixa de ser amigo nunca o
foi nunca..
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(*) Publicado no Recanto de
Letras em 02/09/2014
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