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quarta-feira, 25 de julho de 2012

ESCOLHIDOS E CAPACITADOS - Uma incursão na gestão do trabalho...





Por Carlos Sena (*)

Gosto dos ditos populares. Eles são a, digamos assim, filosofia popular daqueles que não tiveram oportunidade de acesso à universidade. Por isto dizem do seu sentimento de mundo na forma como a realidade é fotografada no dia a dia, senão não seriam “populares”. Contudo o popular não contém o popularesco, embora o popularesco contenha o popular de forma não lapidada. Assim, vejo com muito bons olhos os ditos populares e os “eru-ditos”... Algo como “não importa que a burra manque, mas que a carga chegue”...

Na vivência interpessoal de Gestão de Pessoas – nosso labor cotidiano no serviço público, um dito popular nos chama atenção: “Deus não escolhe os capacitados, mas capacita os escolhidos”... Cristo seguiu essa assertiva quando escolheu doze apóstolos sem nenhuma capacitação para pregar a lei do amor – aquela lei que substituiu a do “dente por dente e olho por olho” e que nós, em pleno terceiro milênio estamos tentando consolidá-la. Como disse, “capacitar os escolhidos” é dos chavões populares o que mais gosto. Porque entendo que para se compor equipes de trabalho em qualquer nível de gestão pública ou privada é fundamental contar com gente motivada, disposta, de confiança... Pode até não ser de todo capacitada, mas isto passa a ser um detalhe que se consegue com o tempo. O contrário – gente capacitada é importante, desde que se consiga conjugar competência com caráter, com confiança e com garra para desenvolver ações laborais nos diversos segmentos do conhecimento humano.

O mundo moderno tem que buscar a excelência. Mas já se sabe fartamente que excelência, a rigor, não sai tão somente dos bancos de Universidades; sabe-se da mesma forma que competência técnica e habilidade profissional não se dissociam de um processo formal de educação. Parece meio confuso, mas esse é o limite do humano nas questões de Relações do trabalho, principalmente pela intersubjetividade que o valor do trabalho nos dispõe enquanto processo. Na área pública da saúde, por exemplo, não se pode imaginar um médico sem que tenha passado pela Universidade. Esta, quase sempre, não coloca o profissional direto no mercado de trabalho, pois o seu aprendizado maior se dá via residências médicas e através de especializações, mestrados e doutorados...

Supondo-se que ele seja excelente médico, que conduza o ato médico com a devida competência, mas se não tiver excelência no trato com os colegas e com o paciente, certamente nenhuma instituição irá se interessar nele enquanto força de trabalho. Isto sem mencionar aspectos éticos da profissão que se o profissional não exercitar, com certeza ficará mais distante do dos seus pares. Por outro lado, um médico simples, "vacinado contra a síndrome de estrelismo", mas que tenha vontade e compromisso com o paciente e com o serviço, levará imensa vantagem sobre o outro. O primeiro médico – capacitado, mestre, doutor, etc., mas sem escuta, sem saber conduzir um processo clínico, sem é ética profissional é, certamente nota “SEM”... O segundo médico deste exemplo, com certeza, será mais importante para a comunidade, pois a função médica, sendo humana por excelência não se alimenta de títulos ou de vaidades profissionais tolas. O meio termo disto seria a glória – um médico que agregasse títulos, ética e amor á profissão. Como isto é quase um milagre nos dias atuais, capacitar os escolhidos é a pedida. Exemplo disto está em nossa rede pública de saúde que tem vivido cheia de dificuldades, mas socorrida por abnegados profissionais de saúde: escolhidos por concurso público, mas capacitados no dia a dia das nossas urgência e emergências. Quem tiver alguma intimidade com o SUS certamente vai entender com mais propriedade essas considerações. No dia a dia das nossas unidades públicas, há médicos extremamente comprometidos e fazendo verdadeiros “milagres” anonimamente! Os medalhões, não raro, fazem do serviço público “bico” e dos seus consultórios, ostentação e afronta pela forma diferenciada que atendem nos seus consultórios os pacientes particulares ou de convênios caros.

Esse foco na categoria médica não é “patrulhamento”, mas a fotografia em preto e branco da realidade por que passa o serviço público no Brasil, principalmente pela falta de médicos no mercado de trabalhos. Embora sabendo que isto não justifica a “reserva de mercado” que a categoria médica está fazendo deliberadamente, o que nos cabe é ressaltar que boa parte deles (médicos) não está preocupada com quem pode morrer na fila do SUS. Preocupam-se, principalmente, com “quem lhe paga mais” e isto tem levado os municípios a viverem reféns desse mercado espúrio. Espúrio não porque os médicos não devam ganhar dignamente. Devem sim e muito bem. Contudo, explorar os vínculos públicos de que são detentores para, dentro deles, ganhar dinheiro no mesmo horário de trabalho é outra coisa. Poderão dizer que é problema gerencial como de fato também é.  Isto perpassa pela formação doméstica, pela consciência cidadã de cada um. Por outro lado, o serviço público, não se preparou para agilidade administrativa que os tempos modernos requerem. Poucos são os serviços públicos hoje que conseguem fazer com que médicos assinem o ponto na forma convencional ou eletrônica. Mas essas questões são carentes de maiores contextos que, no momento não é nossa intenção. Como dissemos, nossa proposta foi, como gestor do trabalho no serviço público fazer, digamos, uma “ODE” a capacitação dos servidores – médicos ou não médicos, pois é praticamente assim que hoje sobrevivem os serviços públicos. Algo como: de um lado estão os médicos, do outro lado os outros. Esses “outros” podem ter várias denominações e cada um pode dar a sua.

Capacitar os escolhidos é sucesso garantido, considerando que esses escolhidos careçam de educação continuada ou permanente, principalmente em funções gerenciais... Quem é gestor sabe que pouco adianta gerenciar um trabalho com gente sem sentido de equipe; com pessoas que só saibam FAZER sem saber ELABORAR. Fazer e elaborar são dois termos fortes que compõem nossa assertiva acerca dos escolhidos e dos capacitados. Escolhendo bem as pessoas, principalmente aquelas detentoras de sentimento de equipe e comprovada ética profissional aplicada, é um excelente começo... Porque tudo se delineia enquanto processo, não enquanto resultado. Se os processos de trabalho forem bem compartilhados em todos os sentidos, os resultados virão como consequência. O contrário disto, seria algo meio surrealista como um amontoado de técnicos de primeira grandeza, mas sem nenhuma capacidade de intervir na realidade concreta.  O mundo ainda está com muitos desses profissionais rodando no mercado de trabalho. Entram e saem dele com muita facilidade, mas não criam “limo” em canto nenhum... A vida precisa de poesia, mas precisa de praticidade. Só com poesia a gente não enche a barriga, pois a barriga cheia vem da praticidade na produção dos bens de consumo. A Barriga estando cheia, a poesia toma forma e nos deixa felizes...

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(*) Publicado no Recanto de Letras em 05/07/2012

Um comentário:

  1. José Fernandes Costa25 de julho de 2012 às 22:16

    Trocando em miúdos: - Enquanto você descansa, eu carrego pedras. Enquanto você escreve, eu trabalho. Enquanto eu durmo, Maria lê. Enquanto a vida passa, eu me divirto. Enquanto o dia não raia, eu desfruto da boêmia. - Enfim, para fechar com um dito popular, também, eu acrescento: - "Não confunda as obras de arte do mestre Picasso, com a pica de aço de mestre de obras."/.

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