Por Zé Carlos
Tenho muitas lembranças da Semana Santa em Bom Conselho. E quem nas as tem tendo lá vivido muitos anos? Eu acompanhei sempre no Blog das CIT várias pessoas, o Diretor Presidente, o Gildo Póvoas, a Lucinha Peixoto e outros, o que eles escreviam sobre este dia. Hoje tive vontade de escrever, e fui àquele blog que morreu, mas, sempre espero que ele ressuscitará um dia, (e que talvez seja no próximo domingo) para ver o que havia por lá.
Encontrei um texto de autoria do Diretor Presidente (desculpe não ter pedido autorização para publicar) que é mais ou menos apropriado porque fala de episódios religiosos em nossa terra que parecem muito com alguns que eu mesmo passei, embora ele seja um pouco mais novo do que eu. Mas, por exemplo, como é visto no texto, também fui batizado pelo Padre Alfredo e crismado pelo Dom Expedito, embora nunca tenha cometido nenhum pecado por debaixo do capote.
Nesta época onde se tenta mudar o nome de nossa praça principal para homenagear o velho Padre Alfredo, nada melhor do que falar dele um pouco como o faz o Diretor Presidente no seu texto publicado no dia 9 de abril de 2009 (Padre Alfredo, as laranjas e outras lembranças...), para entrar na campanha. Fiquem com o DP e tenha uma Boa Páscoa!
“Foram tantos os debates, crônicas e artigos sobre religião que, certas horas, o nosso espaço aqui na CIT, parecia a Capela Sistina, ou mesmo a Igreja Matriz de Bom Conselho, na sala sobre o altar de N. S. do Carmo, onde, quando pequeno e quase coroinha, assistia às reuniões da Sociedade São Vicente de Paulo. Quem foi lá sabe: as presenças de Augusto e Zé Basílio, eram a única certeza da reunião, além da de São Vicente, é claro. Era só para homens. A de mulheres era a Irmandade do Coração de Jesus, onde a certeza era a presença de minha avó.
Este ambiente, cheirando a Deus, nos faz relembrar fatos relativos à nossa infância e adolescência ligados a nossa formação religiosa. Atualmente, eu me considero um meio termo entre Cleómenes (ateu) e Lucinha (católica praticante). Sou católico, não aderi nem abandonei, e vou vivendo, esperando, pelo menos um Purgatório. Inferno, não. Já basta o que passei. Céu, não mereço, cometi e cometo ainda meus pecados. Mas voltemos ao passado.
De tempos em tempos, parece-me, bimestralmente, visitava Padre Alfredo. Que petulância a minha, dizer que era recebido, de vez em quando, por um dos grandes vultos da nossa história. Mas era. Não sei precisamente o porquê, mas desconfio. Sem querer desmerecer essa histórica figura, ele parecia gostar muito de laranjas. Não, não e não. Não é isto que hoje chamam de laranjas: seres humanos usados para acobertar crimes de outros. Naquela época, laranja era ainda um fruto que, hoje sei, de grande valor nutritivo e aquelas a que me referirei, doces e saborosas. No quintal da minha avó havia um pé, não era laranja lima, era laranja bahia. Não sei explicar a qualidade e tamanho destas laranjas. Soberbas. Por um longo tempo com afreqüência acima mencionada, minha avó colhia, ou me mandava colher algumas laranjas e levar para o Padre. Eu esperava ansioso, não para agradá-lo nem à minha avó, e sim, porque, no ato da entrega, uma gaveta era aberta e vinha dois mil réis para meu bolso. As vezes tinha até uma pergunta, que nem dizia a minha avó: Como vai seu pai? Ainda creio hoje que a beleza, doçura e tamanho daquelas laranjas eram conseqüências das rezas do Padre Alfredo. Boas lembranças.
Porém, nem só de lembranças boas vivemos. Nem mesmo as religiosas. Fui batizado pelo Padre Alfredo. Será que ele sabia, quando me tacou aquela água fria na cabeça, que eu iria ser seu supridor de laranjas? Minha primeira confissão foi com ele também, depois dela nunca mais voltei a me confessar, com ele. Primeiro ele não perguntava se eu fazia isto ou aquilo. Partia logo para: Diga seus pecados! E durante a confissão eu tinha a sensação de que ele ia sair e me dar uma pisa. Era o jeito dele. Certo dia num debate religioso com meus colegas, não sei se Teofinho estava presente, o tema era: quando a missa começa realmente? Um dos meninos, parece que era Mané Catita, defendia que era na elevação e eu dizia que era na comunhão. Lá vinha Padre Alfredo, corremos prá ele e eu disse: A missa só começa na comunhão, não é padre? Resposta: “mas, é melhor chegar antes”. Até hoje não sei a resposta correta. Vou a tão poucas, mas é melhor ir e chegar antes da comunhão. O melhor confessor que tive foi Frei Leão, sabia tudo de ruim que fazíamos e ainda maneirava na penitência.
Lembrança pior ainda. Fui crismado, também na Igreja Matriz. Pelo bispo de Garanhuns Dom Expedito Lopes. Não sei se me recordo da meiguice do seu olhar pela sua presença na cerimônia ou se foi pelas inúmeras fotos que vi dele nas reportagens das revistas que noticiavam a sua morte. Hoje tenho outra visão daquele assassinato. Não importa. As lembranças de criança é que me fazem escrever sobre isto. Ainda vejo alguém dizendo: o Padre Hosana matou D. Expedito. Choro lá em casa e na casa da minha avó. No entanto, o que lembro mais foi ver estampada a foto de um bispo morto na revista O Cruzeiro. Não sei como aquele triste episódio influenciou minha vida religiosa. Minha avó dizia que toda boa família tinha que ter um padre. Tinha grande esperança em mim. Será que saber que um Padre matou um Bispo pode ter feito minha família perder um grande Sacerdote? Só Deus saberá ao certo, mas, em minha visão adulta, a conduta dos que fazem nossa igreja sempre influenciará nos seus destinos, através dos seus efeitos, principalmente sobre crianças e jovens. E hoje, para o bem ou para o mal, temos mais do que a revista O Cruzeiro.
Lembranças mais amenas. Um dos meus sonhos infantis era aprender a ajudar missa. Aquele ritual em latim, os paramentos, o cheiro de incenso que ficava da bênção do dia anterior, eram para mim o grande sentido da vida. Foi numa dessas bênçãos, à tardinha de um domingo, não sei o motivo ao certo, mas deveria ser algumas das muitas festas religiosas da época, que adentrei a Igreja vindo da matinê do Cine Rex. Vestia um capote daqueles azuis-marinhos que não tinha mangas mas tinha uns botões dourados, normalmente compridos, devido a economia das mães daquela época visando seu uso por muitos anos. Recordo vivamente o ambiente sério e contrito como convém a um ato religioso. Sentei, com outros meninos, no degrau mais baixo do altar-mor, era um costume antigo. Ficávamos lá e participávamos daqueles atos da melhor maneira que nossas idades permitiam. Debaixo do capote, estava cometendo um pecado. Meu Deus como pude fazer aquilo? Um frade, não me vem agora à memória o seu nome, era alto e era capuchinho, percebeu alguma coisa por debaixo do capote e desconfiou. No final da bênção, me chamou à sacristia: abra o capote, disse ele. Estava ali, paralisado diante daquele homem com uma batina marrom e uns cordões brancos. Pensei, vou entrar nos cordões hoje. Abri devagarinho o capote e lá estava: umas 5 ou 6 revistas em quadrinhos, ou gibis como chamávamos. O que é isto? Perguntou o frei. Tentei explicar: vim do cinema, frei, e, não querendo perder a bênção, não pude deixar os gibis em casa. Não entrei nos cordões, mas ouvi um pequeno sermão levando a crer que a Igreja não era lugar para revista em quadrinhos. Na última vez que fui á missa, nos dias atuais, lá estava um livrinho em quadrinhos mostrando os passos da via sacra. Bons tempos estes. Qual deles?”
Nenhum comentário:
Postar um comentário