Por Zezinho de Caetés
Eu temo muito pelo Brasil quando a imprensa começa a fazer
comparações com a Argentina. Por séculos esta comparação, quando
feita, é porque o país vizinho está começando mais um ciclo de encolhimento
político e econômico, para nos chamar a atenção de por onde não se deve ir.
Encontrei, semana passada em O Globo um texto da Miriam
Leitão, cujo título era: “O que se passa
na Argentina” e as comparações com nosso país são inevitáveis, pois de uma
forma ou de outra ainda não nos livramos da síndrome da idiota sul-americana.
Leiam o texto da Míriam e eu volto lá em baixo, se sobreviver à queda dos juros
que não caem.
“Empresários brasileiros já estão repensando os investimentos na
Argentina. Não exatamente porque houve a expropriação da YPF, nem mesmo pela
maneira como aconteceu, mas porque o ambiente para negócios é cada vez mais
hostil.
Tudo pode acontecer a partir de uma ordem de Guillermo Moreno ou por
algum rompante da presidente Cristina Kirchner. A incerteza jurídica é um
ambiente onde o investimento não prospera.
Brasil e Argentina estão unidos pela geografia e separados pelo
temperamento. Certa vez, um ministro argentino me disse que a distância entre
um e outro é a mesma que existe entre o tango e o samba.
Os dois países enfrentaram problemas muito parecidos ao longo da sua
história, com reações diferentes, pelo menos na intensidade.
A hiperinflação deles elevou os preços a níveis muito mais altos do que
no Brasil. Eles fizeram um plano que era baseado no câmbio fixo. Só que era
rígido. Uma lei proibia a desvalorização da moeda. Nós fizemos um plano que
usou o câmbio quase fixo por algum tempo. As duas políticas cambiais entraram
em colapso depois de alguns anos.
Aqui, houve alguma confusão, mas a inflação foi controlada rapidamente
ao custo de um ano sem crescimento. Na Argentina, tudo acabou em queda de
governo e longa recessão.
O Brasil aprendeu a lição e nada alterou o compromisso com as bases da
estabilidade, nem mesmo a alternância de partidos adversários na Presidência da
República.
A Argentina volta a brincar com o mesmo animal, permitindo que ele se
aproxime cada vez mais da economia.
Há artificialismos assim: a presidente visita uma empresa e pergunta
por que certo produto não está sendo vendido no mercado. O empresário responde
que não é do gosto argentino, por isso ele é feito apenas para exportação. No
dia seguinte, o empresário recebe um telefonema de Moreno, que o manda pôr no
mercado o tal produto e informa a que preço deve ser vendido. O empresário
avisa que aquele preço dá apenas para cobrir o custo da embalagem. Moreno liga
então para a empresa fornecedora e dita o preço que ele vai fornecer a
embalagem. A empresa pede desconto no custo da energia. E recebe.
Isso é fato real. Aconteceu com empresa brasileira. Moreno, para quem
não sabe, é quem manda chover e parar de chover no país, por ordem da
presidente. É secretário da Indústria e Comércio, mas é como se fosse
primeiro-ministro. Houve um tempo em que ele despachava com revólver em cima da
mesa. Hoje, já o recolheu à gaveta, ainda que ameace com outras armas os
empresários que não o obedecem.
Ele ligou para um empresário brasileiro estabelecido no país e
determinou que suspendesse as exportações. Quando o executivo disse que tinha
contratos a cumprir, ele respondeu que não os cumprisse porque aquele produto
tinha que ficar no mercado interno.
No Brasil, há também decisões controversas. Aqui foi elevado o imposto
interno para carro importado, apesar do alerta de especialistas de que isso
fere regras da Organização Mundial do Comércio.
Na Argentina, o governo suspendeu a licença automática de importação e
isso está criando problemas concretos para exportadores brasileiros que não
podem embarcar mercadorias já vendidas.
Inúmeras empresas brasileiras estão na Argentina vivendo situações em
que o voluntarismo substitui leis de mercado. O Brasil é visto hoje como uma
economia mais organizada e mais previsível, o que pode, num primeiro momento,
nos favorecer, mas os descaminhos do vizinho não nos ajudam.
Para o Brasil, o ideal é que a Argentina tenha sucesso, porque o
comércio entre os dois países é pujante, e os interesses comuns se adensaram
muito nos últimos anos. O problema é que acordos comerciais negociados pelo
bloco com alguns países ou regiões podem emperrar a partir de agora. O acordo
Mercosul-União Europeia, por exemplo, é melhor deixar para outra oportunidade.
Atualmente há muito ruído em torno da decisão tomada pelos argentinos.
O “Wall Street Journal” pediu em editorial a expulsão da Argentina do G-20, a
Espanha ameaça parar de comprar grãos do país e pressiona a União Europeia a
retaliar também, as ações da YPF despencam, e diversas autoridades do mundo
fazem admoestações ao governo. Tudo isso pode passar, mas ficará a cicatriz.
Cartazes pregados nos muros argentinos dizem que CFK enfrentou YPF e
que agora as petrolíferas “são nossas”. Isso pode soar aos brasileiros de forma
simpática pela lembrança da campanha do “petróleo é nosso”. É bem diferente.
A empresa argentina tinha sido privatizada, aliás com o apoio dos K.
Claro que o país pode mudar de ideia, mas tudo seria aceito se fosse dentro da
lei e com indenização negociada aos donos da companhia.
O governo Lula também reclamou que a Vale não investia em siderúrgica
no Brasil. A briga foi pública. Os acionistas, entre eles fundos de pensão de
estatais e o BNDES, trocaram o presidente da Vale. O mercado não gostou e as
ações da mineradora perderam valor, mas a empresa não foi ameaçada de
expropriação.
Decisões governamentais controversas existem de um lado e outro da
fronteira, mas o que a Argentina fez foi quebrar o cristal da confiança do
investidor. Isso produz consequências difíceis de mensurar, mas que se
prolongam pelo tempo.”
O grande problema da economia mundial hoje é sua
interligação pelas várias formas de comunicação, inclusive as físicas. É possível
hoje, em períodos curtíssimos, o deslocamento de coisas e pessoas pelo nosso
querido planeta. E quando se fala em comunicação digital estamos à velocidade
da luz, literalmente.
Quando eu soube da falsificação, por parte do governo
argentino, de dados sobre inflação, é porque todos os que tem mais interesse do
que eu nisto já sabiam, e as ondas de notícias pelo mundo do negócio passam a
circular. Eu me lembro muito bem da Lei da Informática, se não me engano no
governo Sarney, que até hoje nos custa um certo atraso tecnológico nesta área
tão importante para o mundo moderno. A proteção excessiva é um mal para o
comércio mundial e sua eficiência, e quando esta proteção vem em forma de
falsificação de informação por governos, é sempre um desastre o seu
descobrimento.
E como nós sofremos com a Lei da Informática, o país vizinho
vai sofrer com a nacionalização da YPF, não só por causa da empresa em si, mas,
pela onda de desconfiança que isto gera nos investidores. Hoje, não temos como
fugir dos ditames dos mercados e do sistema capitalista. Os países que restam e
que resistem a eles de verdade, vivem hoje na pobreza e tentando mudar a
situação como Cuba e Coreia do Norte, por exemplo. A China apenas finge que
aguentará o regime político fechado por mais algum tempo, quando sua economia é
quase toda capitalista.
Isto é o que o texto anterior chama com absoluta propriedade
“cristal de confiança do investidor”,
que está perto de se quebrar de novo no país vizinho, e devemos evitar que isto
ocorro no nosso. Eu diria que, um dito que ouvi na infância vem a calhar para
mostrar sua atitude: “macaco velho não
põe a mão em cumbuca”.
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