Por Carlos Sena (*)
Finalmente a novela terminou. Como todas, tudo se acomodou e os noveleiros devem ter se dividido com os desfechos dados. Confesso que vi o final apenas e tão somente por Crô. Crodoaldo – referência ao nosso Clodovil a quem muitos chamavam de Clô. Um parêntese: conta-se, a título de piada, que Clodovil teria respondido a quem, sem ser intimo, lhe chamou de Clô: “Não me chame de Clô. Eu sou Clô para os íntimos, VIL para os inimigos e DÔ pra quem eu quiser”.
No inicio da novela eu meti o pau no personagem, por entender que aquele tipo caricato em nada acrescentaria à luta contra o preconceito. Até porque no dia a dia, as bichas pintosas não são tão pintosas e afetadas como o personagem quis passar. Mesmo assim ponderei levando em conta ser um folhetim que precisa de ibope pra se manter no ar, embora isto não justifique diante da luta contra a homofobia. Num dos meus artigos no RECANTO DAS LETRAS foquei a relação entre Crô e Tereza Cristina em forma de perfil psicanalítico entre os dois. Neste final de novela, fiquei feliz por ter feito esse perfil tão perto da realidade dos personagens de Aguinaldo Silva.
Diante da TV, esperei o desfecho de Crô, diferentemente do que muitos quiseram saber: quem é seu namorado? De quem seria aquela tatuagem no pé de um dos “bofes” sugeridos? Todos deram com os burros n’água, digo com as penas n’água. O autor da novela me surpreendeu positivamente: Crô destilou que não iria dizer quem seria o seu namorado, mas insistiu no preconceito que as bichas que não são pintosas tem com as que são assim, digo, PINTOSAS – expressão deveras conhecida no mundo gay. Achei digno esse aspecto que a novela abordou. Pena que foi no final, mas valeu a pena, pois a grande maioria de gays tem preconceito com quem não se mostra parecido com homem, embora na cama seja uma mulher. Os travecos, os transexuais, as bichinhas pintosas são muito discriminadas. Serem discriminados lá fora por aqueles que se julgam héteros, até que existe uma compreensão, mas preconceito entre os iguais apenas pela forma ser diferente nos parece uma grande contradição.
Portanto, fica a lição. Como se vê, há mais mistérios entre o céu e a terra do que nossa vã filosofia possa imaginar, já nos dizia o filósofo. Que todos os viados, os frangos, os baitolas, os frescos, os falsos à bandeira, enfim, todas as denominações populares, mas todas de gay, aprendam a lição; que não julguem para não serem julgados; que não pensem que quem imita homem ou é gay do armário é diferente das bichinhas pintosas. Sabe por quê? Na cama todos fazem as mesmas coisa e isto é bom porque ajuda a ser feliz. Agora ninguém nunca será feliz se achando melhor do que os seus iguais, apenas porque eles têm uma forma diferente de ser, diferente da sua.
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(*) Publicado no Recanto de Letras em 25/03/2012
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