“Os meandros da Justiça
POR MERVAL PEREIRA
É costumeiro dizer que o tempo jurídico é diferente do da
política. Desta vez, eles estão se aproximando. O ex-presidente Lula, pela
conta mais conservadora, cumpriu ontem um sexto de sua pena de 8 anos, 10 meses
e 20 dias definida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no caso do triplex de
Guarujá. Poderia ir para o regime semi aberto.
Ao mesmo tempo, o Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para
amanhã o julgamento de um caso semelhante ao do ex-presidente do Banco do
Brasil e da Petrobras, Aldemir Bendine, que teve a condenação anulada devido ao
entendimento da Segunda Turma de que réus delatores devem falar antes dos
demais réus, pois seriam auxiliares da acusação. E a defesa deve falar sempre
por último.
Se o entendimento da
maioria acompanhar o da Segunda Turma, não apenas os julgamentos de Lula, mas
de vários outros condenados, podem ser anulados, recomeçando do zero.
Em outro processo contra Lula, o do Sítio de Atibaia, está
tudo pronto para o julgamento do recurso da defesa no Tribunal Regional
Federal-4 (TRF-4). O ex-presidente foi condenado em primeira instância a 12
anos e 11 meses de prisão pela juíza Gabriela Hardt, que substituiu
interinamente Sérgio Moro quando este deixou a magistratura para tornar-se
ministro da Justiça.
O desembargador João Pedro Gebran entregou seu voto no dia
11, depois de 90 dias de análise, e o revisor Leandro Paulsen também já
terminou seu trabalho, restando agora o presidente do TRF-4, Victor Luiz dos
Santos Laus marcar a data do julgamento. Isso quer dizer que Lula poder ser
condenado novamente antes mesmo que os trâmites burocráticos para a progressão
da pena sejam cumpridos. Ou que fique pouco tempo no regime semi-aberto, tendo
que voltar para a prisão fechada.
Nesse caso, as sentenças são somadas e o cumprimento de um
sexto da nova pena vai demorar mais. A não ser que, nesse intervalo, uma nova
decisão do STF proíba a prisão em segunda instância. O que pode demorar também
é a insistência de Lula em não querer pedir a progressão da pena, aguardando
ser inocentado ou ter a condenação anulada.
Há ainda outro recurso que já pode ser marcado no STJ, onde
a defesa de Lula pede, desde maio, que ele, em vez de ir para o regime
semi-aberto, pois não há vagas em locais apropriados, vá direto para o aberto.
Com a nomeação do substituto interino do ministro Felix
Fischer, relator das ações da Lava-Jato, o caso já pode ser decidido.
A decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF)
de anular o julgamento que condenou Aldemir Bendine por ter recebido R$ 3
milhões da Odebrecht para facilitar contratos da empreiteira com a Petrobras,
que presidia na ocasião, é uma interpretação alargada do direito dos réus,
mesma prática de que o juiz Sérgio Moro e os procuradores de Curitiba são
acusados.
Como lembrou ontem no twitter o juiz Marcelo Bretas, “no
processo criminal brasileiro sempre houve delatores e delatados, réus confessos
que depõem contra corréus”. Ambos sempre foram tratados igualmente como réus. A
nova interpretação da Segunda Turma, tratando os delatores como auxiliares da
acusação, tem espaço devido à figura da “delação premiada”, que não existia no
processo penal brasileiro.
Tanto que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) e
o Superior Tribunal de Justiça (STJ) referendaram a decisão de Moro, apesar dos
apelos da defesa. Justamente por ser uma decisão sem precedentes, caso
semelhante está sendo levado ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF).
O caso de Bendine, se estiverem esgotados os recursos do
Ministério Público e o acórdão publicado, poderá se tornar único se a maioria
do plenário do STF decidir em contrário. Ou pode dar inicio a uma
jurisprudência.”
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