“Sem política
não há solução
O Estado de
S.Paulo
Como há muitos
anos não se via, as eleições de 2018 serão marcadas por um misto de indignação
e desalento em relação à atividade política e aos políticos, um sentimento que
parece permear quase todos os estratos sociais. Os sinais deste estado de
espírito da sociedade podem ser observados tanto no clamor difuso por algo
“novo” na política, ainda que não se saiba exatamente o que isto significa - um
novo nome, um novo modo de agir, talvez ambos -, como no número de eleitores
que se declaram indecisos, que anularão o voto ou afirmam que não votarão em
ninguém no pleito de outubro.
A descrença de
uma parte significativa da sociedade em relação aos políticos, tomados assim,
genericamente, e à política dita tradicional não é gratuita e tampouco fruto de
má vontade ou elucubrações conspiratórias dos brasileiros. Há razões para tanta
desconfiança. De um lado, por óbvio, ela advém da traição dos maus políticos à
confiança neles depositada por seus eleitores. São poucos os atentados contra a
democracia representativa mais graves do que a ruptura do liame entre
representantes e representados pela desonra dos primeiros no exercício do múnus
público.
Por outro lado,
esta crise de representatividade que põe em xeque a atividade política no País
também pode ser entendida como um fenômeno provocado. Desde o sucesso popular
alcançado pela Operação Lava Jato - sucesso merecido, diga-se -, alguns setores
do Ministério Público Federal (MPF), da Polícia Federal (PF) e do Poder
Judiciário, animados pelo calor dos holofotes e dos afagos da opinião pública,
autoatribuíram-se uma missão de salvação nacional, uma espécie de plano
permanente de combate à corrupção, causa maior de todos os males do País, a fim
de resgatar uma sociedade sequestrada por uma “classe política” carcomida. Em
nome da batalha épica contra um inimigo tão poderoso, os limites do Estado
Democrático de Direito, não poucas vezes, foram solenemente ignorados
justamente por aqueles que deveriam ser os primeiros a lhes prestar reverência.
Alvissareira,
portanto, é a mensagem da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF),
ministra Cármen Lúcia, durante a abertura do 2.º Congresso de Direito Eleitoral
de Brasília, ocorrido na capital federal na quinta-feira passada. A ministra
criticou o que chamou de “demonização” da política, além do “excessivo” número
de partidos políticos - atualmente, são 35 legendas registradas no Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) -, que, segundo Cármen Lúcia, carecem de
“objetividade” programática.
“Demonizar a
política não faz com que não tenhamos o caos”, disse a presidente do STF. De
fato, a democracia, o regime de pleno exercício da atividade política, não está
livre de imperfeições e, por si só, não previne crises. Trata-se de um regime
em constante processo de autorregulação por meio das instituições do Estado e
da participação responsável dos cidadãos em aperfeiçoamento.
Em boa hora, a
ministra Cármen Lúcia lembrou que “o País vive uma crise, mas deve melhorar
quando a população for comprometida com a ética e a construção da democracia”.
De fato, pouca atenção tem sido dada à responsabilidade dos eleitores pela
qualidade da representação política e, em última análise, pela saúde
institucional do Brasil. Em outras palavras, o País dará um salto no processo
de amadurecimento da democracia representativa quando os cidadãos se derem
conta da importância de suas escolhas para o destino do País.
“Hoje vivemos
um momento particularmente grave onde a maioria acha ruim tudo que está aí,
desde a fila do açougue até o governo, e tem o direito de achar. Mas ele (o
cidadão) fura a fila do açougue e acha que o secretário (de governo), quando
fura a fila da licitação, é que tem de ser punido”, afirmou Cármen Lúcia.
Em outubro, a
sociedade tem nas mãos o poder de criar o futuro que deseja para o País. Com
este poder há de vir também a responsabilidade. Sem política, não há solução
possível para o crescimento de uma nação. E a boa política é uma construção de
todos.”
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AGD
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