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sábado, 4 de agosto de 2012

UM PASSEIO SENTIMENTAL



Marco Zero - Recife


Por José Antonio Taveira Belo

Encontro Juvenal após um longo período. Caminhava pela Avenida Guararapes. Apoiado em uma bengala caminhava devagarzinho desviando do ruge-ruge das pessoas que transitavam pela calçada mal conservada. Ia para o Recife antigo. O sol a pino e com aquele passo somente lá pelo meio dia chegaria ao destino. Paramos em frente à Igreja de Santo Antonio na Pracinha do Diário. Ali tomou fôlego, afrouxou o colarinho da camisa branca e tirou o chapéu e com um lenço creme enxugou o suor. Entrou na igreja e em pé fez uma pequena oração e saiu.

Queres me acompanhar? Convidou. Vês que vais levar tempo e ter paciência de acompanhar um deficiente, disse.

O tempo para mim não importava e com aquele convite convidativo, pus-me a andar o acompanhando em passos lentos. Atravessamos a Avenida Mariz de Barros e tomamos a ponte Mauricio de Nassau em direção ao Recife antigo. O vento morno soava em nosso rosto já envelhecido. Uma barca no meio do rio, com o pescador equilibrando-se sob o balanço das águas, lançava uma rede em busca de siris. Paramos junto à escultura do poeta Joaquim Cardoso para observar aquele cenário. Continuamos a caminhar. O Juvenal apontou para o Edifício Chantecller ainda em reforma. Disse, quantas vezes nós estivemos ali? Muitas vezes! Subíamos as escadas em caracol com algumas “meninas” descendo ou subindo para o primeiro e segundo andar. A musica em radiolas de fichas tocava musicas sentimental e ali muitas das vezes sentávamos servindo-se uma dose de Rom Montilla ou uma cerveja bem geladinha, observando as meninas sentadas de pernas cruzadas dando aquele “lance” e nós ficávamos de boquiaberta. Os mais espertos e que tinha “gaita” convidava alguma delas para sentar-se a mesa e ensaiavam alguns passos no piso de madeira corrida. Que tempo bom! Relembrava enquanto ajeitava o óculo escuro no rosto suado. Parando e olhando para o alto, o céu azul e sol vivo sufocavam a nossa voz. Vivenciar isto aqui é reviver um passado que somente é lembrado pelos nossos pensamentos. As noitadas passeando por aqui, com as “meninas” postas nas calçadas se oferecendo com os seus vestidos e suas maquiagem escandalosas, passeando ou em pé nas portas dos bares com os seus sorrisos convidativos nas ruas Vigário Tenório, Madre Deus, Mariz de Barros, Rio Branco, Marques de Olinda, Bom Jesus, Apolo, Alfredo Lisboa e a terrível Rua da Guia, quase ninguém seguia por esta rua, pois, se dizia que até pelo vento pegava uma doença venérea.

Chegamos finalmente, na Avenida Marques de Olinda, passando por onde era o Restaurante Gambrinus e o Bar Astoria, todos desativados e que naquele tempo era ponto frequentado pelos boêmios e notívagos. Caminhávamos devagarzinho. O vento vindo cais já trazia certo conforto atenuando o calor sufocante. Como as coisas mudaram! Ninguém ou quase ninguém desconfia que neste pedaço o ”pecado” aflorava. Hoje o que existia aqui se espalhou por toda a cidade. Hoje já não existe cabaré onde os homens procuram as “meninas” para lhe alegrar nem que seja por alguns minutos. Tudo isto é passado. Chegamos finalmente, a praça do “Marco Zero”. Atravessemos a rua e paramos no meio da praça em cima da “Rosa dos Ventos” e de lá saboreando o cheiro da maresia em pleno sol do meio dia. Ali observamos e contemplamos os obeliscos artista Francisco Brennand. Chegamos na amurada do cais. Alguns botes fazia a travessia até os obelisco ia e voltava com alguns turistas. Olhamos de um lado para o outro e encontrávamos um bar onde antigamente era a Pensão de Maria Boa. Sentamos e pedimos uma cerveja geladinha, para combater o calor que sentíamos. Sentado, como antigamente, em uma mesa posta na calçada, uma bela morena de olhar sedutor fomos servido, ela, colocando o precioso liquido em cada copo e se retirando com um rebolado estonteante.

E Juvenal, disse quantas saudades do meu tempo de juventude. Sorvemos um gole e começamos a lembrar daquele velho tempo.  E, tu como vais? Eu é que vou levando a vida desta forma, escorado em um pedaço de madeira. Um AVC me pegou de surpresa. E o resultado estas vendo. Mas vou vivendo! O que posso fazer? Nada!

Juvenal morou em pensão na Rua Barão de São Borja no final da década de 60 e ai demos a conhecer no Bar Santa Cruz e posteriormente no Bar Savoy, onde todo o sábado pela manhã nos reunia. Conheceu dona Terezinha, com a qual vive há quarenta anos, em uma noite de sexta feira no Clube das Pás. Desse relacionamento nasceram duas moças e dois rapazes, todos formados, advogados e um médico. Tô realizado, disse-me, olhando para a bela morena que trazia a “saideira”. Pagamos a conta e saímos de volta pelo mesmo caminho, já às quatro e meia da tarde. Chegamos a Avenida Guararapes já com as luzes acessas. Despedimos-nos e saímos cada um para apanhar o coletivo em seus devidos terminais.

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