Por Lucinha Peixoto (**)
Estou em casa cozinhando. Entre um “trim” e outro do marca
tempo de cozinha, resolvi escrever. Sentei, fiquei como o Gildo uma certa vez,
olhando para o tempo. Fui no site de Bom Conselho, no Mural, li quem eu sempre
leio, procurando inspiração. Escrevi umas baboseiras nele e voltei. “Trimmmm”,
era o tempo do feijão de coco. Mexi. Voltei. Tudo cheira a Semana Santa.
Pensei, vou escrever sobre o São João. Mas, quem iria ler? Resolvi não inovar
muito. E lá vem a Vida Paixão e Morte de Jesus Cristo, outra vez.
Hoje começo pelo fim. À noite irei assistir à Paixão de
Cristo do Recife. Já fui, alguns anos atrás. É um bonito espetáculo, e para nós
católicos, a questão de texto, interpretação dos atores não vem muito ao caso.
Eu choro nos espetáculos da paixão desde que via, no Cine Rex aquelas Vidas de
Cristo, mexicanas, cujos diálogos seriam, mais ou menos assim (não sei
espanhol):
- Como te hamas?
- Yo me hamo Pedro.
- Te hamavas, ahora
serás pescadores de los hombres!
E por ai vai, passando pelo circo do Zé Bezerra, no qual vi
Jesus ser retirado da cruz umas três vezes, e ainda chorava.
A Paixão do Recife, mesmo quando assisti pela primeira vez,
já achei o José Pimentel um pouco velho para o papel. Jesus então fica, com
todo respeito e pedindo o perdão ao verdadeiro, no linguajar do meu filho mais
novo: “caidaço”. Hoje à noite ele ainda está lá no batente. Não sei se é por
isso que o patrocínio ao espetáculo vem caindo. Vamos ver se ele ainda consegue
carregar a cruz, e me emocionar. Se eu chorar, pode continuar, Pimentel.
Mas o patrocínio flui mesmo é para a Paixão em Nova
Jerusalém. Todo ano é um Cristo novo e é um ator global. Engraçado que são bons
atores. Fui dois anos e chorei nos dois. Porque é que a Rede Globo tem os
melhores atores? Todos sabem, sou fã de novelas (aguardem a crônica sobre O
Caminho das Índias, perdão meu Deus) e as desta emissora se sobressaem porque,
acho eu, os atores são melhores. No entanto, pelo menos deveriam deixar um
mesmo Jesus por alguns aninhos. Quando disseram que o ator deste ano era um
Murilo, eu pensei, não, o Dódi, não.
Sem querer fazer propaganda, a CIT não firmou ainda nenhum
contrato com a Globo, digo que a coisa lá em Nova Jerusalém é bonita. Um pouco
cansativa, sim, mas, a beleza supera o cansaço. Embora quase ficamos sem tempo
de chorar.
“Trimmm”, é o bacalhau de forno que ficou pronto. Receita de
minha mãe, desde quando em Bom Conselho, bacalhau era comida de pobre. Meu pai
contava, vinha numas barricas, baixas e redondas, não sei de onde, e era
barato. Quando víamos uma mulher baixa e gorda, a comparávamos a uma barrica de
bacalhau. Vou tirar do forno mas, volto..
Aproveitei e também tirei o peixe do fogo. Igual ao bacalhau
hoje, o preço está pela hora da morte. Eu não sei como os pobres deste país
poderão cumprir os preceitos de nossa Santa Madre Igreja, de não comer carne
nestes dias santos. Comendo ovo, talvez. Porém, são estas coisas que eu digo,
se não puder comer peixe, tenho certeza que Jesus, em sua infinita misericórdia,
perdoará aquele que não o fizer. Jejuar, como faziam meus avós, pode ser até um
bom motivo para minha filha perder peso, mas para uma pessoa pobre pode ser até
prejudicial a saúde. São preceitos que a própria Igreja vai aceitando, ou pelo
menos, os homens de boa vontade que a compõem.
Começamos pelo fim, agora voltemos ao início. Em minha época
de adolescente em Bom Conselho, os rituais religiosos da Semana Santa eram
feitos com muito esmero, devoção e carinho pela fé. O lava pés na Quinta-feira
Santa, a procissão de Sexta-feira, Sábado de Aleluia, que terminava com a
ressurreição de Jesus, eram memoráveis. Na quinta eram os meninos que se
vestiam de apóstolo e iam para o lava-pés (homens da CIT e de Bom Conselho,
escrevam sobre isto), havia ainda os Ben-hur, na sexta-feira éramos nós,
mulheres, de Pecados. Maria Madalena, lembro um ano que foi Marilene de Dona
Luisinha e Santa Verônica, posto cativo de Nevinha de Chico Cardoso, tudo isto
me vem à mente, será que ela ainda funciona? Fui Pecado. Sim havia os 7 Pecados
Capitais (agora lembrei do texto de Gildo, editado por Cleómenes). Fui, poucos
anos, Luxúria, era cor-de-rosa, tomaram meu lugar. Dona Maria Francisca me
disse que só tinha lugar para Avareza, cor amarela. Meu pai falou que não tinha
dinheiro para comprar o tecido outra vez. Deixei os pecados. Só tinha dinheiro
para ver a procissão passar e ver Dona Lourdes Cardoso, puxando o canto:
- Perdão meu Jesus,
perdão Deus de Amor, perdão Deus clemente, perdoai Senhor!
Finalmente, ficava, com as amigas, rodando na Praça Pedro
II, no sábado de aleluia, rezando para que a achassem, de sorte que o mundo não
tivesse fim. Nunca permanecia até muito tarde. Meu pai era um zeloso senhor
que, como quase todos na época, achava que chegar tarde em casa, tirava a honra
das filhas. Ainda lembrava disso quando as minhas chegavam aqui em Recife, de
madrugada. Nem dizia nada.
Quase hora do almoço. Todos a postos. Uma feliz Páscoa para
todos.
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(*) Publicado no Blog da CIT em 11.04.2009. Só não é muito
atual pelas citações das novelas globais, cujas estórias já me esqueci. Agora
já estou na Avenida Brasil. Mas, ainda continuo fazendo minhas comidas típicas,
embora lá em Gravatá. Este ano não irei ver o José Pimentel, mas dizem que ele
está lá firme. E haja tintas para os cabelos. Continuo desejando uma feliz
Páscoa para todos.
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(**) Publiquei esta semana uma carta da Lucinha Peixoto. Foi
um sucesso de audiência. Fiquei até com inveja. Como sabia que havia um texto
em seu blog, que falava da Semana Santa, resolvi publicá-lo, enquanto eu também
como meu feijão de coco, e sinto saudades dos velhos tempos, belos dias, de Bom
Conselho (ZC)
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