“A vitória do cansaço
Editorial dO Estado de S.Paulo
As eleições de domingo passado
representaram um duro revés para partidos e políticos tradicionais,
transformando um deputado do baixo clero, filiado apenas recentemente a uma
legenda inexpressiva, no principal eleitor do País. O candidato a presidente
Jair Bolsonaro e seu partido, o PSL, são os maiores beneficiários de um
movimento desorganizado e espontâneo que ansiava por alguém disposto a
liderá-lo em seu desejo de castigar o lulopetismo e sanear o País, visto por
esses brasileiros como visceralmente corrompido na política e nos costumes. Se
há hoje um partido com ampla penetração nacional, em quase todos os estratos
sociais, econômicos e regionais, é o partido da revolta contra a desfaçatez dos
que há tempos se assenhorearam do Estado, aparelhando-o politicamente e
arrancando-lhe privilégios. Bolsonaro e o PSL deram a face institucional a
esses brasileiros.
Tal fenômeno só foi possível
porque os partidos ditos tradicionais falharam miseravelmente em sua tarefa de
representar os anseios desse eleitorado que cansou de pagar impostos e de
receber em troca um tratamento quase hostil de um Estado loteado pelos de sempre;
que cansou de ser acusado de insensibilidade social por criticar as políticas
assistencialistas; e que cansou de ser chamado de “golpista” por manifestar seu
repúdio à corrupção. O ápice da revolta pode ser localizado em 2013, quando
milhões foram às ruas para deixar claro ao então governo petista que a farsa do
“nunca antes na história deste país” já não enganava mais ninguém. Nem essa
imensa demonstração de força foi capaz de tirar aqueles partidos de sua
inércia.
O resultado disso pôde ser visto
agora nas urnas. PSDB e MDB, dois gigantes da Câmara, farão companhia na
próxima legislatura ao pelotão de partidos médios, pois foram punidos em razão
de sua timidez perante o desafio de fazer frente às muitas demandas represadas
de seus eleitores. Vários dos políticos mais conhecidos e poderosos do País
foram barrados nas urnas.
Já o PSL, graças à força do
fenômeno Bolsonaro, elegeu 52 deputados – um crescimento exponencial em relação
à eleição de 2014, quando conseguiu fazer apenas um deputado. Os candidatos a
deputado mais votados também são do PSL. Nas eleições estaduais majoritárias,
quase todos os candidatos que se apresentaram como aliados ou simpatizantes de
Bolsonaro, mesmo pertencendo a outros partidos, tiveram excelente desempenho.
Tal cenário dá a entender que, ao
contrário do que se poderia imaginar, um eventual governo Bolsonaro teria
razoável base no Congresso para trabalhar, condição essencial para superar os
imensos desafios à frente.
Já a esquerda também apresentou
desempenho respeitável, mesmo tendo de lidar com a herança maldita do
lulopetismo. Somados, os candidatos Fernando Haddad (PT) e Ciro Gomes (PDT)
tiveram 41% dos votos, e o PT deverá ter a maior bancada da Câmara. Assim,
Haddad, embora tenha discursado em favor de uma ampla frente “em defesa da
democracia” no segundo turno, o que poderia sugerir um aceno aos partidos de
centro, não parece fazer nenhuma questão de se distanciar do lulopetismo
raivoso que tantos votos lhe garantiu. Ao contrário: seu primeiro compromisso
depois do primeiro turno foi viajar a Curitiba para pagar uma visita ao
verdadeiro candidato do PT à Presidência, aquele que se faz representar por
interposta pessoa na cédula por estar cumprindo pena em regime fechado por
corrupção e lavagem de dinheiro.
Diante de um segundo turno que se
afigura muito difícil, em que a vantagem de Bolsonaro está na casa dos 18
milhões de votos, Haddad e o PT parecem inclinados a manter intocado o
patrimônio lulopetista com vistas ao futuro – pois o partido, noves fora
algumas derrotas constrangedoras, como a da presidente cassada Dilma Rousseff
ao Senado por Minas, surge como líder natural e aguerrido da oposição a um
eventual governo Bolsonaro. Com isso, mais o enfraquecimento dos partidos que
não se situam nos dois polos que hoje disputam o poder, pode-se esperar que a
falta de moderação que tanto tem marcado esta eleição infelizmente continue a
pautar a política nacional por um bom tempo.”
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