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terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

MEU BLOCO NA RUA




Por Carlos Sena (*)

Sou lírico assumido. No carnaval de Pernambuco subo e desço ladeiras atrás de blocos líricos. Eles desfilam em poesia, em tons românticos de festa. Os blocos do meu Recife são poemas que encantam pelo sentimento, pela história de cada canção e pela canção de cada história que se descortina nas ruas estreitas dos bairros antigos da cidade. Olinda não fica na platéia. Ela adentra suas ladeiras naturalmente ou a fórceps se for o caso. Sua magia nos lembra aquelas de além mar. Lembram também as de Salvador do Senhor do Bonfim. Olinda, contudo, é mais. É mais porque tem Recife. É mais porque se tem em si mesma na cultura e nas artes.

Sou lírico assumido e se isto for pecado, pois que seja mortal. Essa chama é aquela em que todos os amantes adoram ter porque seus amores são meio  viscerais, senão não seriam grandes nem seriam amores. Não há amor no marasmo, na calmaria. A calmaria pode ser produto dos amores intempestivos, contraditoriamente vulneráveis em si mesmos...

Por isto sou lírico e adoro. Em cada bloco, em cada frevo, em cada enlevo, em cada brilho de olhar que pulula em cada ala, lá estou eu sendo tudo e sendo nada. No carnaval tudo e nada parecem uma coisa só. O deputado que parece ser tudo, lá é nada. Um popular que se julga nada no seu cotidiano, no carnaval se julga tudo: um rei, príncipe, empresário.

Dentro dos blocos líricos tem perfume do BLOCO DAS FLORES, tem as artimanhas de Lili que nem sempre toca Flauta. Tem as recordações do bloco da Saudade. Tem o Bonde carregando foliões audazes, tem Madeira que cupim não rói – desfilando um Rosarinho de confetes e serpentinas; tem Pás Douradas espalhando brilho por todo Campo Grande, tem  Abanadores que sacode o arruda em festa, tem Vassourinhas que varre as tristezas de um ano todo enquanto o carnaval não vem. Também tem  Banhistas que no pina não empinam papagaio. Dentro dos blocos tem passado, tem presente, mas não se sabe do futuro. Futuro dos frevos de blocos está na capacidade de cantar a alma e pra ela; na força de resgatar o passado sem fazer dele uma cantilena de recordações infelizes.

Olinda quero cantar. Recife neste carnaval rende homenagem ao sambista brasileiro. A Noel, Sonhô e Chico Alves... A Capiba, Nelson Ferreira, Levino, Ascenso, Zé Puluca e Dona Iracema. Minha canção não tem aspas, não tem trema, nem travessão. Minha canção é frevo de bloco que subloco minha ilusão consentida parida no afã de ser feliz como se não houvesse quarta feira, tampouco cinzas. Na Rua da Imperatriz eu era muito feliz, vendo o bloco desfilar acorda Apolônio... Saudade é isto que a gente sente, saudade é coisa que dá na gente, de alguém que partiu, alguém que morreu, alguém que o coração não esqueceu... Quem tem saudades não está sozinho tem o carinho da recordação. Por isto quando estou mais isolado fico bem acompanhado com você no coração...

Amanhã, embora na certeza de que tudo passa, tudo será passado. O carnaval terá passado. O papel terá passado. O troféu terá passado. O amor terá passado. O coração terá ficado, mesmo que morto e sepultado. Sina de coração não é a imortalidade, mas a transitoriedade permitida no soltar da emoção sem limites.

Agora o meu bloco precisa perfilar. Um banjo esbanja de sua capacidade e invade os quatro cantos da minha premonição. Há dúvidas dentro do pressentir: Bairro de São José? Praça Maciel Pinheiro? Largo da Misericórdia? Varadouro? Aldo da Sé? Rua da Imperatriz? Rua Direita? Rua de Dentro! Essa é a rua que meu bloco vai desfilar!

Pela possibilidade de encontrar a estrela, decido pela Praça Maciel Pinheiro. Afinal, não é toda praça que tem o privilégio de ter sido o palco de sonhos da nossa dádiva Claridade Clarice Lispector...

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(*) Publicado no Recanto de Letras em 03/02/2012

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