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sábado, 25 de fevereiro de 2012

BLOCOS DO "EU SOZINHO"




Por Carlos Sena  (*)                                     

Da janela do meu quarto vejo os blocos passarem em festa momesca. Troças, caboclinhos, clubes tradicionais. Blocos do “Eu sozinho” entremeiam os movimentos que sobem e descem rumo às ilusões perdidas. Penso que as melhores ilusões são mesmo as perdidas, porque se não fossem assim, perdidas, talvez não nos levasse a busca incessante de ser feliz. Os blocos do “Eu Sozinho” refletem um pouco disto em plena avenida. De repente um boteco e um gole de bebida. No carnaval melhor chamar de bebida, pois muitos bebem tudo e, quando embriagados tentam, nalgumas vezes beberem a si mesmos ou a quem por perto de convier. Sinto em cada um daqueles que ali vão à busca de algo que nem mesmo sabem o quê, a permanência da vontade de tudo ser, talvez porque passam o ano todo na  suposta tristeza de nada serem.

O carnaval tem essa proeza. Transforma o belo em beleza, o súdito em realeza, o submisso em brabeza. Conclama o drama como se comédia fosse e faz da comédia o destino dos que, solitários lhe cultivam como ultima saída pra ser feliz. Sorrir é remédio pra curar o tédio, para resvalar a loucura que a sisudez falso moralista do cotidiano impõe. O carnaval propõe a não proposta da tristeza. Enaltece a beleza que se enamora das colombinas e pierrôs para semear no passo do frevo que a vida não tem travo, mas que é preciso ousar dela e rir dela e zombar dela. A vida sendo zombada se degenera em rios de felicidade – talvez ela saiba mesmo que só vale a pena viver se for na forma liberta que tão bem um beijo na boca de quem se ama significa.

No bloco do “Eu Sozinho” um flabelo discreto se posta na mão do passista. Apressa a passo, reverencia o estandarte e se perde nas esquinas onde supostamente as ilusões pegam o bonde do amor. “Bloco das flores, Andaluzas, Pirilampos, Após Fun” – eis o estribilho do frevo de bloco que irrompe no pátio de Santa Cruz. Sinal da cruz faz o passista que, sozinho, empunha seu flabelo e se perde junto da multidão ignorando que ela existe. Para aquele passista só existe mesmo o passo. O passo que ele deu em busca do sonho, do emprego, do amor...

Um dia será quarta-feira de cinzas e não se sabe se haverá pecado para ser perdoado. Da janela do meu quarto já não vejo mais os blocos, nem as troças, nem caboclinhos, maracatus... Há “Eus sozinhos carregando sonhos em suas marmitas frias”. Há “EUS” sozinhos esquecidos de que as esquinas em que passam são as mesmas que buscaram, no carnaval, ilusões perdidas. Pelo visto as ilusões continuam per-di-das, se-pa-ra-das! Devem ter sumido quando o clarim de momo, lá do alto da Sé de Olinda, entoaram os acordes do final do carnaval. Acorda Recife acorda, que já é hora de estar de pé. Levanta o carnaval começou no Bairro de São José...

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 (*) Publicado no Recanto de Letras em 16/02/2012

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