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domingo, 26 de dezembro de 2010

Caruaru e o Natal de Barro


Por Zé Carlos

Interrompo a série sobre minha viagem a Bom Conselho, para falar de outra cidade: Caruaru. Ela pertence ao mesmo agreste da nossa cidade. E assim como Bom Conselho vive perdida entre o início e o fim do Estado de Pernambuco. Nem somos nem de lá como Petrolina nem de cá como o Recife. Estamos no meio. Geopoliticamente, o meio é sempre mais difícil. O poder sempre começou pelas bordas no Brasil e em muitos outros países, principalmente os colonizados, desde o renascimento.

Os que tomaram posse, começaram como caranguejos pelo litoral, fincaram seus brasões e suas armas, para depois começar a exploração mais para dentro deste mundão, que é o Brasil. Pelo menos nisto Caruaru se parece com Bom Conselho. Embora existam outras semelhanças, aqui não a mencionaremos, deixando para o leitor mais conhecedor de ambas as cidades o exercício da imaginação.

Meu relacionamento com Caruaru foi sempre uma passagem para o Recife. Desde que íamos na estrada de terra até São Caetano, quando fiz minha primeira visita à capital pernambucana. O ônibus passava bem pelo meio da cidade. Não lembro muito como ela era. Apenas pressentia que ela já era muito maior do que a cidade de onde saímos. E a primeira lembrança que me vinha à mente, quando pensava na cidade era sua Banda de Pífanos. Não se falava ainda sobre o Vitalino, o Mestre do Barro.

Igual a Luis Gonzaga, que no passado não tão distante era considerado um músico voltado para os “caipiras” e “bahianos”, pelos nossos cultos críticos de arte, talvez, o Mestre Vitalino estivesse escondido neste poço imenso de beleza, que é a cultura popular, e que um dia, como o teatro, a ópera, o jazz, já foi motivo de chacota para quem não tem sensibilidade para reconhecê-la de pronto.

Hoje quando entramos em Caruaru e visitamos alguns dos seus pontos turísticos, não é só sua feira, cantada em prosa e belos versos, que define esta cidade. Basta prestar atenção para descobrir que aquilo que unifica culturalmente esta cidade é o barro. O mesmo barro de que Deus fez o homem, hoje é usado por este para recriar a cidade. Não se pode imaginar um só recanto neste aprazível e buliçoso lugar sem uma escultura de barro que lembre a arte maior do Mestre Vitalino.

Nos restaurantes, nas praças, nos shoppings centers, nas ruas, temos sempre o prazer de ver, o que vi tanto na minha infância na feira de Bom Conselho: Bois, cavalos, cachorros, homens de todos os tipos, com uma característica comum, o barro neles duro e pintado de mil e uma formas. Também fiz meus trabalhos para a cadeira de D. Eunice Silvestre (Trabalhos Manuais), usando o barro muitas vezes, produzindo aquelas horrendas criaturas que eu chamava de bois. Mas, hoje, só em Caruaru o barro venceu. Parece que tudo é barro. Até nos engarrafamentos monumentais causados pelo ritmo frenético de “desenvolvimento”, dar para nos imaginar, estáticos, de barro dentro dos nossos carros de barros.

Neste Natal passeei com o meu neto, que lá mora. Fui a um presépio, da mesma forma que fui um pouco antes na Matriz de Bom Conselho. Qual a diferença entre os dois? O de Caruaru era feito de barro, e para mostrar o barro. O de nossa cidade até poderia ter algumas das figuras de barro, mas a tendência era escondê-lo. Ninguém está certo nem está errado, nem um é mais bonito, nem mais feio. O que os distinguem são os fatos culturais por trás da lapinha. Uma é de barro e a outra não é.

Nos últimos tempos fiquei admirando Caruaru, não só porque o meu neto mora lá, mas porque seu povo está sabendo aproveitar sua cultura do barro para se impor diante da massificação informativa. A cidade só tem a ganhar se além de um Natal de Barro, tiver um São João de Barro, e um ano inteiro de barro, para mostrar Caruaru como a Cidade de Barro.

Fiz um filmezinho da lapinha de barro que mostro abaixo para vocês. Outro dia conto sobre o que vi em Bom Conselho.

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