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sábado, 8 de março de 2014

20 anos do Plano Real, a aflição do Zé Serra e nossa também




Por Zezinho de Caetés

Durante o carnaval eu fui juntando artigos, na base do copia e cola, já prevendo a baixa de atividade que haveria depois dos festejos de momo. Quase todos brincam carnaval e aqui, em Pernambuco, vamos até o Bacalhau do Batata, na quarta-feira de cinzas para começar a respirar outra vez.

Entre esses artigos encontrei um que, apesar de não morrer de amores por uma parte de sua ideologia do autor em relação à intervenção do Estado na economia (nisto ele parece muito com a Dilma embora entendendo muito mais de economia, pois a presidenta tem demonstrado não entender nada do assunto) o José Serra escreveu no Estado de São Paulo em 27/02/2014, com o título: “Estados Unidos do Atraso Sul-Americano”, o qual reproduzo abaixo.

Minha decisão sobre qual texto comentar aqui para a AGD não foi fácil. Vi antes, um editorial do mesmo jornal que falava dos 20 anos do Plano Real, do qual os nossos jovens talvez não saibam a importância, mas deveriam saber. Sem ele, é impossível saber como hoje estaria o Brasil e como estariam todos os políticos que viveram aqueles momentos. Possivelmente, já nos teríamos tornado uma Venezuela, com todas aquelas mazelas, de que trata o Serra, como comentarei a seguir. Para aqueles que não viveram este período cito apenas uma texto do editorial:

“Há 20 anos uma revolução sem armas e sem passeatas começou a mudar a vida dos brasileiros, quando o presidente Itamar Franco assinou a Medida Provisória (MP) 434 e criou a Unidade Real de Valor (URV), embrião de uma nova moeda, o real. Naquele mês de fevereiro, os preços ao consumidor subiram 40,27% e a alta acumulada em 12 meses chegou a 757,29%. Em 2013, a inflação anual ficou em 5,91%. Há 20 anos, os preços de bens e serviços aumentavam muito mais que isso em apenas uma semana. Recebido o pagamento, os trabalhadores corriam ao supermercado para abastecer a casa. A corrosão do salário em poucos dias era muito maior do que foi em todo o ano passado.”

É quase inacreditável e justifica o título do texto: “A revolução do real”, porque foi uma verdadeira revolução na vida dos brasileiros. Foi ali que começou a inclusão social do povo brasileiro (e o PT foi contra o plano), principalmente, dos mais pobres, que até então só viam o nosso dinheiro como papel sem valor e que ao recebê-lo deveria logo ser passado à frente devido sua desvalorização quase na velocidade da luz. A piada de que antes do almoço nos restaurantes o preço era um e no seu término preço era outro, não está muito longe da verdade. Era um verdadeiro sofrimento para todos mas um verdadeiro suplício para a classe pobre que não tinha meios de proteção contra a queda no poder de compra.

Foi neste plano que os governantes descobriram que a “moeda” é um bem público, como tantos outros que nos são caros, e a sua preservação é uma das obrigações mais importantes do poder político. Infelizmente, hoje, os políticos no poder brincam com o fogo do dragão inflacionário, que já queima a Argentina e a Venezuela. Eu não tenho dúvida de que, se o PT continuar no poder, toda a conquista deste Plano revolucionário, irá d’água abaixo.

E é neste contexto latino-americano e as reações do nosso governo ao que hoje ocorre na Venezuela, com sua inflação galopante, que entra o artigo do Serra. Ele resume com uma clareza e poder de síntese exemplares algumas semelhanças dos governos Lula e de Hugo Chávez, o que desmistifica a mitificação do Lula como o grande pai dos pobres, quando se verifica que o avanço em termos econômicos (e a tão propalada inclusão social) foi fruto mais do período de bonança da economia mundial, do que de sua capacidade de gestão. O que ele fez, e agora a Dilma está pagando o pato, foi o enfraquecimento de nossa economia com a desindustrialização e nos tornando dependentes do exterior em quase tudo, além da herança maldita para sua criatura presidenta que não sabe o que fazer com tantos furos, a não ser mentir descaradamente sobre a situação econômica, esperando milagres.

E a desfaçatez no apoio ao chavismo na Venezuela continuou depois que o Maduro está caindo de podre, apelando para uma ditadura disfarçada pelo controle das instituições, e que só merece o repúdio do povo de lá e de cá.

Mas leiam o texto do Serra, abaixo, para terem uma boa ideia de onde estamos e para onde podemos ir nestas eleições. Vejam que o discurso do governo hoje não passa de desculpas esfarrapadas procurando bodes expiatórios na tentativa de completarem os 12 anos de escravidão do nosso povo. Já chega!

“Quando o governo Dilma endossou uma nota detestável que o Mercosul emitiu sobre a crise política na Venezuela, que exerce sua presidência rotativa, o atraso político chegava, finalmente, à altura do obstáculo que o bloco econômico tem representado para o Brasil. Explicarei o que quero dizer.

Ao lado das diferenças, durante seus mandatos presidenciais, o coronel Hugo Chávez e Lula tiveram ao menos três coisas em comum. Em primeiro lugar, desfrutaram a mais espetacular fase de bonança externa de que se tem memória, traduzida em juros internacionais no chão e preços de exportações primárias nas nuvens - petróleo, de um lado, produtos agrominerais, do outro. Em segundo lugar, enfraqueceram suas economias, desindustrializando-as e tornando-as muito mais dependentes do exterior em matéria de consumo e bens de investimentos - justo eles, que se diziam de esquerda e, com diferença de graus, anti-imperialistas... Em terceiro lugar, deixaram heranças econômicas amargas para seus sucessores, que se revelaram, infelizmente, plenamente despreparados para governar de verdade, isto é, entender a situação, antecipar-se aos acontecimentos, formular e implantar estratégias de recuperação, saber comunicar-se e amenizar as expectativas pessimistas sobre o futuro de suas economias e de seus países.

Tudo em termos relativos, é óbvio. Na Venezuela, em face do maior subdesenvolvimento e do componente ditatorial do regime chavista, a crise tem sido infinitamente pior. A economia e o abastecimento derreteram. A inflação avizinha-se dos 60% ao ano - é a maior do mundo. Há forte escassez de alimentos. O preço do dólar paralelo é oito vezes maior que o oficial. A falta de divisas paralisa as atividades que utilizam insumos importados e provoca desabastecimento de 50% dos medicamentos. Por isso tudo, os antagonismos tornaram-se muitíssimo mais exacerbados. Há motivos de sobra para as pessoas irem às ruas reclamar.

O governo venezuelano já tinha suprimido na prática a liberdade de imprensa e fechado os caminhos da oposição e agora reinaugurou no continente a era das prisões políticas e do assassinato de opositores anônimos, com suas forças paramilitares. Uma espécie de SA nazista à moda venezuelana. O desenlace poderá ser trágico, mesmo que o presidente Nicolás Maduro continue sob a proteção da alma dickenseniana de Chávez, com quem ele assegura conversar regularmente.

O PT tem afinidade eletiva com o chavismo e a reação do governo brasileiro ante a repressão aos manifestantes de oposição na Venezuela trouxe a política externa do Brasil ao seu nível mais baixo desde 1965, quando o general-presidente Castelo Branco, na postura de ajudante de ordens do presidente Lyndon Johnson, mandou tropas para auxiliarem os EUA na invasão da República Dominicana. Nessa época eu vivia no exílio e convivia com estudantes de vários países da América Latina - os leitores não calculam a vergonha que dava ser brasileiro naquele momento da invasão. No episódio venezuelano não estão envolvidas tropas, mas houve um sopro de maior covardia: foi disfarçado de membro do Mercosul que o Brasil subscreveu o manifesto que culpou as vítimas pelos massacres e pela instabilidade do governo de Maduro.

Quando foi deposto o presidente Fernando Lugo, dentro das regras constitucionais, o petismo e o kirchnerismo resolveram suspender o Paraguai do Mercosul, invocando a cláusula democrática, que virou piada. Aproveitaram para aprovar o ingresso da Venezuela no bloco, ao qual os paraguaios se opunham, com poder de veto.

A estupidez política, finalmente, se casava com a estupidez econômica. O pior do Mercosul não veio do atual governo brasileiro nem dos Kirchners ou de Maduro. Nasceu nos governos Collor e Menem, no início dos anos 90, quando previram um acordo que criaria, além de uma zona de livre-comércio entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai - o que era correto -, também uma união alfandegária em quatro anos, o que Europa demorou 40 para fazer. Ou seja, se o Brasil quiser fazer um acordo com algum país para ampliar seu comércio, os demais membros do Mercosul têm o direito de obstruir ou vetar caso não se sintam bem atendidos.

Isso é o que está acontecendo, por exemplo, com a tentativa brasileira de negociar com a União Europeia (UE), que já dura mais de dez anos. Os argentinos têm retardado a negociação, e podem fazê-lo, embora de forma humilhante para nós: em reunião preparatória já exigiram até que o Brasil se retratasse das declarações da nossa embaixadora junto à UE, que havia atribuído a eles o notório atraso na apresentação da proposta conjunta.

A solução mais fácil, porém, não é ficar brigando com a Argentina, mas acabar com a união alfandegária de vez, deixando ao Mercosul a tarefa já hercúlea da zona de livre-comércio, hoje tão incompleta. Só que isso vai contra um dogma do atual governo brasileiro: transformar facilidades em dificuldades.

O colapso da política externa brasileira é apenas um detalhe da perda de rumo de um partido e de um projeto de governo que fracassaram. Sua agenda evaporou-se e, agora, os petistas estão à cata de outra qualquer que lhes permita montar, para usar o termo da moda, uma narrativa eficaz para a campanha eleitoral. Com a agravante de que aquela cascata da suposta "herança maldita recebida do neoliberalismo" já não cola. Não é mais possível demonizar as privatizações, agora que o PT se ajoelha no seu altar, orando pelo advento da grande panaceia para tudo.


O governo atual conseguiu a façanha de combinar a estagflação com expectativas péssimas sobre o futuro da economia, piores até do que os principais indicadores justificariam. O grande pesadelo dos agentes econômicos hoje não são o baixo crescimento, os juros siderais (de novo, os maiores do mundo) ou o déficit externo, o terceiro mais alto do planeta em volume e o segundo como porcentagem do PIB. O que os assusta de verdade é a possibilidade de que esse governo se prolongue por mais quatro anos. Haja aflição!”

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