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sexta-feira, 9 de maio de 2014

O CACHORRO DE BOTAS - Doby, um cachorro de bom caráter


Doby em seu local preferido


Numa das minhas caminhadas matinais, conheci o Doby. Um cachorro vira-lata, cotó e até malcheiroso. A primeira reação minha, acostumado a ver o Nick e sua turma, todos asseadinhos, limpinhos e fofinhos, foi perguntar se na casa dele não havia água. Contive-me e não me arrependi, depois de conversar com ele, e ver que não se deve julgar os cachorros somente pela sua aparência, mas, pelo seu caráter. Pensei logo outra vez no Cachorro de Botas, o Nick, desprovido totalmente de caráter, me dizendo ao pé do ouvido:

- Zé Carlos, de que vale um bom caráter dentro de um saco de lixo?!

Fiquei só pensativo sobre como me dirigir ao Doby porque ele costuma ficar no topo do escorrego para crianças, apenas observando as palestras do Nick, e de vez em quando balançando a cabeça com ar de reprovação. Só esta sua atitude reprovativa das ideias do Nick já me fazia ter alguma simpatia pelo Doby. E esta empatia com ele só aumentou quando um amigo do Nick me disse ter sido ele muito amigo do cachorro do Marcos Freire, cujo dono eu conheci como professor. Talvez, venha daí o seu bom caráter.

Resolvi então me aproximar do Doby, que vive sem nenhuma coleira e não sei nem quem é o seu dono, e começar a falar sobre amenidades. Aproximei-me e quando vi seu olhar e seu rabo cotó balançando fiquei confiante e seguro de que seríamos bons amigos. Alguns dizem que “quem se junta com porcos farelo come”, o que é um absurdo para esta época de ração para todos. Se alguém me disser, com certeza, o que estamos comendo ao ingerir uma salsicha ou uma ração para cachorros, eu dou a mão à palmatória. Enquanto isto não acontece, fico mais amigos do cachorros, porque já tive muitos amigos que não chegavam nem às patas deles.

- Olá Doby, muito prazer! Está sozinho hoje?

- Caro Zé Carlos, eu sempre estou sozinho mesmo quando estou acompanhado. Aliás, isto se aplica a todos, cachorros e humanos. O que vale na vida são nossas ações individuais. Este negócio de decisões coletivas é coisa de cachorro sem noção ou com um tremendo mau-caráter. A vida é só nossa e o que acontece com ela é uma consequência direta do que fazemos, mesmo que estejamos no meio de uma multidão.

Eu fiquei estupefato com a linguagem e com o porte altivo do Doby, mesmo sem prestar atenção na filosofia que estava por traz de sua fala. E até agora estou pensando se o Nick estava certo ou não, quando defendia tanto as decisões em grupo, de preferência, com más intenções. Insisti, querendo pescar mais pensamento canino daquele cachorro quase sem rabo, que se aproxima tanto de alguns raciocínios humanos.

- Doby, quando falo sozinho me refiro que hoje não há nenhum outro cachorro na praça!

- Eu entendi, Zé Carlos, eu entendi. Apenas quis logo apresentar meu pensamento em relação ao que ouço nas palestras do Nick, e que agora tem tantos seguidores, e parece, inclusive até você.

- Calma Doby, eu não concordo com tudo que ele diz. Apenas não quero ser indelicado pois não sou um cachorro, e não quero interferir no papo de vocês.

- Quer dizer, meu caro, que você nos acha seres inferiores, porque somos cachorros?! Não me responda sim, porque assim minha decepção seria muito grande.

- Claro que não, Doby, o que penso é que “cada ser vivente em seu galho”. Não tenho preconceitos contra cachorros, macacos ou outro bicho qualquer. Apenas temos vidas sociais diferentes.

- Aí é que você se engana. Nossas vidas e a de vocês não são tão diferentes assim. O que ocorre é que a imaginação humana ainda é muito pobre para captar a riqueza de nossa vida animal. Quando aparece um humano com alguma imaginação neste sentido, e nos apresenta como gente, vocês dizem a suas crianças que somos desenho animado. Isto é cruel para nós. Há alguém mais humano do que o Pluto? Grande parte das crianças de vocês têm seu caráter formado a partir das aventuras do Pluto, do Pato Donald, do Mickey Mouse, e tantos outros animais americanos. Infelizmente, o que temos de animais heróis nacionais são muito poucos e da espécie da Mula Sem Cabeça. E vocês reclamam que as crianças depois ficam pensando como os americanos! Não que eu discorde dos americanos e da vida dos cachorros deles. E nem posso discordar. Desde pequeno somos criados com ração, que é uma invenção americana, assim como o osso de borracha, que são nossa Disney.

- Nossa Doby, você parece até irritado. Eu gosto dos animais e os respeito muito.

- Talvez você o faça Zé Carlos, mas, não podemos garantir isto de outros humanos. Eu diria que você é um bom animal humano. Retomo agora ao assunto da solidão do ponto de vista animal. Quando a gente vê um cachorro sozinho pela rua, como você me viu agora, diz logo que é um cachorro vadio, doido ou doente. Isto nem sempre é verdade. Minha solidão é uma opção. Mas, nem sempre o é para todos. E isto não quer dizer que vivo sozinho todo tempo. Apenas que a opção de viver solitariamente também aumenta nossas chances de fazer amizade por mais contraditório que isto pareça. E, no fundo não podemos fugir disto. A sociedade não existe, o povo canino não existe, o que existe são cachorros de carne, osso e rabo, mesmo que cotó como eu, o que já é fruto da maldade humana conosco. Tenho muitos amigos, e que pensam muito diferente de mim, e isto é bom porque tenho minha vida e eles têm a dele. Por isso não sou muito fã do Nick, seu amigo, quando ele quer envolver os outros dentro de sua ideologia de que todos temos que ser iguais e de preferência tão mau-caráter quanto ele.

- Doby, gostei muita da conversa, mas, agora tenho que ir, e nem posso discutir este complexo assunto. Só pergunto mais uma coisa: Você tem amigos na política?

- Claro que tenho. E eles são de quase todos os partidos. Por exemplo, ontem recebi um telefonema do cachorro do Lula, o Pau-de-arara, que estava em Portugal. Está constrangidíssimo com o dono, por uma declaração que ele fez na TV de que o julgamento do mensalão foi 80% político e 20% técnico. Você sabe o que isto significa, não sabe? Ele me disse que seu dono pode até nem voltar para o Brasil. A reação está sendo enorme. Os cachorros do Gilmar Mendes, do Marco Aurélio e do Joaquim Barbosa, não param de latir, eu li hoje, ali na banca de revista. Eu sei que Pau-de-arara nunca foi cachorro que se cheirasse, mas, quando ele fica com medo é porque a coisa está feia para o lado do dono. Ele não quer mais nem ouvir falar da cadela da Dilma, com quem teve um affaire por mais de 12 anos.

- Ok, Doby agora tenho que ir mesmo. Depois conversaremos mais.


E me retirei, impressionado com a fluência do Doby e querendo vê-lo numa palestra do Nick, como debatedor. Teremos pelos e mordidas para todo lado, principalmente se o Popó e o Dudu, também comparecerem. 

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