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segunda-feira, 8 de abril de 2013

Foro privilegiado - II





Por José Fernandes Costa

Muitos dos leitores se lembram de Talvane Albuquerque e Ronaldo Cunha Lima. Ambos foram agraciados pelo foro privilegiado. Mesmo tendo perpetrado crimes contra a vida. Talvane era deputado federal por Alagoas (1995 a 1998), em primeiro mandato. E respondia a processos no Supremo Tribunal Federal (STF). Estava coberto pelo manto da impunidade. – Ceci Cunha também era deputada federal naquele estado. No pleito seguinte, em 1998, Ceci renovou o mandato e Talvane ficou na primeira suplência da mesma coligação. – Aí, segundo os autos do processo, teria surgido o desejo infeliz de Talvane. Qual seja: se Ceci morresse, ele assumiria a vaga dela e continuaria escondido no privilégio do foro e na impunidade.

Posta essa lógica perversa, no dia da diplomação de Ceci, em 16.12.1998, ainda conforme o processo, Talvane mandou matá-la. Com Ceci, foram trucidados, também, o esposo dela e mais dois dos seus familiares, na casa das presumidas vítimas de Talvane. – A tragédia ficou conhecida como a chacina da Gruta. Posto que as mortes foram consumadas na residência de um cunhado de Ceci, na Gruta de Lourdes, em Maceió. E Talvane teve direito à diplomação, posse e aos privilégios, por alguns dias.

Dias antes do crime, Talvane teria dito a um dos supostos pistoleiros, por ele contratados, que “imunidade é poder”! Essa frase cínica atribuída ao ex-deputado, consta da denúncia oferecida pelo promotor de Justiça da 1ª Vara da Justiça Federal de Maceió. – Aquele terrível homicídio é da competência do Tribunal do Júri. Contudo, para esses crimes comuns contra a vida, o foro privilegiado impera do mesmo jeito. – E, em dezembro de 1998, Talvane ainda era deputado em fim de mandato.

Com a morte de Ceci, Talvane tomou posse na Câmara Federal, em fevereiro de 1999. No entanto, foi cassado no dia 8 de abril do mesmo ano, por quebra de decoro parlamentar. No mesmo dia, ainda em Brasília, foi preso, mas respondeu o processo em liberdade. Indo exercer a atividade médica nas cidades de Canindé do São Francisco (SE) e Floresta (PE). Ceci também era médica.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 53, § 1º, prescrevia que, após diplomados os membros do Congresso Nacional não poderiam ser processados criminalmente sem prévia licença da Casa. – Ou seja, se fosse senador, licença do Senado; se deputado federal, licença da Câmara. Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 35, de 20.12.2001, o art.53 acima foi modificado. A licença para processar deputados e senadores foi abolida. Porém, os vários parágrafos mantidos nesse dispositivo, consagram inúmeros privilégios a essa casta de aproveitadores da ignorância e do besteirol do nosso povo.

Talvane Albuquerque, consta dos autos, mandou matar Ceci Cunha pra ficar com a vaga dela na Câmara. E foi diplomado na vaga aberta com a morte dela. – Ou seja, Talvane que teria ordenado a execução sumária de Ceci, foi diplomado deputado e tomou posse na Câmara. Com isso, restou provado que imunidade é poder que garante a impunidade. – E ele precisava daquela vacância, porque já tinha outros crimes encobertos até então pelos privilégios das leis. – Também está nos autos.

Já que o suposto mandante, até então, tinha mandato de deputado federal, o inquérito da morte de Ceci Cunha foi remetido à 1ª Vara da Justiça Federal, em Alagoas. Vejamos um fragmento da peça de denúncia. Diz o promotor público: “Emerge dos autos, finalmente, que os homicídios praticados nas desventuradas vítimas, em particular na deputada Ceci Cunha, tiveram como fim único dar origem a uma vaga de deputado federal na coligação a que pertenciam Ceci e Talvane, o que efetivamente ocorreu, tendo o último tomado posse em meados do mês passado. Saliente-se, por fim, que as circunstâncias e os motivos determinantes dos delitos, denotam a frieza e a crueldade dos executores, elementos de péssimas índoles, contratados mediante promessa de recompensa, por um homem público que nestes vários anos de legislativo, escudado na execrável ‘imunidade parlamentar’ tem praticado inúmeros delitos impunemente.”

Na sentença de pronúncia exarada pelo juiz federal Leonardo Rezende Martins, da 1ª Vara Federal de Maceió, este determinou que fossem a júri federal o ex-deputado Talvane, assim como os executores do bárbaro crime. – Eis um pequeno trecho da pronúncia: - “Ao formular a denúncia (fl. 3-9, vol. 1), o douto promotor de Justiça delineou claramente que o motivo para a prática do quádruplo homicídio fora o desejo de Talvane Albuquerque, que lograra apenas a primeira suplência nas eleições para o cargo de deputado federal ocorridas naquele ano, de permanecer com mandato na Câmara dos Deputados. Para tanto, teria elaborado o plano de assassinar a deputada CECI CUNHA, pertencente à sua coligação partidária, para assim, com a vacância, ocupar sua vaga na condição de suplente.”

Com a morte de Ceci, ao que consta, encomendada contra ela pelo seu concorrente acima, este assumiu o cargo de sua vítima (incrível), o que lhe deu imunidade parlamentar e prerrogativa de foro. Por isso, o processo onde Talvane foi réu pela morte da sua ex-companheira de coligação, tramitou por alguns meses no Supremo Tribunal Federal (STF), por ser ele deputado federal (!), ocupando a vaga obtida à custa do sangue da sua vítima, consoante se depreende da denúncia e da pronúncia.

Assim também, o procurador-geral da República, mais adiante, seguiu a mesma linha de raciocínio do promotor de Maceió, quando os autos subiram para a esfera do STF. Eis um trecho da nova denúncia: “E qual o motivo que levou o denunciado a determinar a execução hedionda dos homicídios de CECI CUNHA e seus parentes, logo no dia em que estavam eles alegres e contentes com a diplomação da falecida no cargo de deputada federal? Sem dúvida, a motivação reside na circunstância de o acusado querer, a todo custo, tomar posse como deputado federal, de forma a se proteger ilegitimamente sob o manto da imunidade parlamentar.”

Por fim, a última notícia sobre Talvane é que ele está trabalhando como psiquiatra no Centro Psiquiátrico Judiciário, no presídio de Maceió, onde se encontra, por ter sido condenado a 103 anos de prisão, 13 anos após cometido o bárbaro crime. – Pela Lei das Execuções Penais, a cada três dias trabalhados, será reduzido um dia da pena aplicada. – E os advogados de todos eles querem anular o júri que os condenou. Não sei qual é o argumento usado para tanto. – Mas, como todos negaram a participação na chacina, imagino que a tese da defesa fora negativa de autoria. E o argumento para anular o júri seria: “Resultado manifestamente contrário à prova dos autos.” (?!) – Isso é absurdo, contrário ao bom senso e à razão. Mas esses advogados devem querer patentear a injustiça./.  

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