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terça-feira, 21 de julho de 2015

SEU CHICÃO




Por José Antonio Taveira Belo / Zetinho


Antes do amanhecer abria a porta do terraço para olhar o tempo. Ainda a lua e as estrelas brilhavam. Pouco a pouco o sol despontava por cima de um abacateiro.   Era um homem do campo, cheio de saúde e força para o trabalho da roça. Antes tirava leite na vaca chamada Pintada, e soltava o cavalo Malhado no capinzal. Morenão forte, cabeleira cheia, olhos pretos e barba grisalha.  Sentava-se a mesa para tomar o café da manhã o cuscuz com leite, macaxeira ou inhame, leite e um pedaço de beiju.  Tomava na mão a enxada e a tiracolo um bornal com algum alimento, agua em uma cabaça colocando o chapéu de palha seguia para o roçado somente vindo a meio dia para o almoço. Nunca sentiu uma dor de cabeça, nem um enjoo ou dor de barriga, tudo em cima dizia ele a sua mulher Chica quando conversava. Nunca foi ao medico apesar da mulher dizer “vá ao médico cuida da sua saúde”, ele dizia o meu medico é uma boa comida e um bom descanso. Mas tu trabalha demais, dizia a mulher. Onde tu já viu Chica trabalho matar a pessoa? Onde diz-me? Ainda eu to pra ver um homem trabalhador morrer por causa do trabalho. Morre se não trabalhar. Fica xoxo, entrevado esperando a morte chegar e que chega logo. Eu vou morrer trabalhando se Deus me der à sorte na roça com a enxada na mão. Morro contente. A sua vida no sitio Pica Pau ladeado por uma estrada que levava ao povoado São João, era a sua vida, não desejava outra. Ali nasceu, cresceu e vou morrer aqui que é o meu lugar. Tinha dois filhos, nada queria com a roça, seguiram para o Rio de Janeiro, e lá estavam muito bem, dizia em carta para sua mãe. Numa final de tarde sentado no alpendre com a Chica cozendo alguma roupa velha com remendo e pregando botão em uma camisa, disse - Tu visse? O cumprade Zaroio teve uma dor de barriga à mulher Dona Cotinha aconselhou ele ir para o médico do povoado. Ele resistiu, mas depois de tanto resmungo resolveu ir. Saiu de manhã, às oito horas já estava sentado no consultório esperando a sua vez. Muita gente, mulheres enroladas em chalés, meninos chorando com dores que ninguém adivinhava, homens conversando na calçada sobre os seus males e com seus problemas para o Dr. Michel resolver, se resolver. Chegou a sua vez. Zaroio entrou sentou-se na frente do Doutor. Ele perguntou o que está sentido? Doutor ontem me deu uma dor de barriga danada, fui ao mato várias vezes escorrendo aquela agua. Tomei chá de goiabeira, de canela, de macaíba, colônia e erva cidreira e nada da dor passar. Nesta manhã Cotinha me deu um caneco com o chá do capim santo, até que melhorei. Hoje vim para o senhor passar um remédio para melhorar, pois eu já sinto melhor, pois a dor de barriga passou. Deite ali. Abra camisa e afrouxe o cinturão. Começou me apertar ali e acola. Dói aqui? Não! Dói aqui? Não! Batia na barriga como fosse zabumba. Levante-se e sente-se e respire fundo, encostando um relógio que tinha duas tira pendurada nas orelhas, no meu peito. Respire fundo. Solte quando eu mandar. Assim fiz. Duas ou três vezes.  Depois desta agonia toda, por uma dor de barriga, mandou eu me sentar e deu-me um papel com alguns nomes escritos que ninguém decifrava especialmente eu que não sabia ler direito. Vá ao laboratório e peça um tubo para colher as fezes e depois traga para me vê. Doutor onde eu vou colher fezes, que eu não sei o que é! Fezes é a merda que o senhor vai botar amanhã quando for ao mato, entendeu? Sai envergonhado. Fui até o laboratório, peguei uma coisinha diminuta, a moça disse – não precisa encher todo só basta um pouquinho e amanhã traga para examinar. Sai mais envergonhado, ainda. Nunca aconteceu isto comigo. Cagar e colocar num tubo e trazer para a moça? Isto não vai dar certo. É um desaforo. No outro dia fez o que pediram. Oito dias foi buscar o resultado. A moça entregou um envelope com folha escrito à máquina de datilografia. Levei ao Doutor Michel, que olhou e deu o veredito – estais com vermes. O que isto Doutor, verme! Que verme este e que não sei que diabo é. Vou te passar um remédio para vocês botar para fora tudo isto. Passou e o cumpdre comprou. Não deu outra, uma caganeira danada, foi pior que a dor de barriga. Foi ao medico que passou outro exame, agora de sangue. Depois passou um exame do mijo, primeiro pingos. Depois passou outros exames, do coração e pensou que tem haver dor de barriga com coração? Perguntou se eu tinha azia. Que diabo é isto Doutor? É queimor na boca do estomago. Não tenho não senhor, nada de queimor.  E assim continuou até hoje não se curou. Queres que isto aconteça comigo, Chica? Não vou a medico nenhum. Tenho setenta anos e nunca tive nada, e depois desta idade tudo é lucro. Vou morrer sim. Vou ficar doente, sim. Mas não vou buscar doença, pois com certeza o que aconteceu com o cumpadre Zaroio vai acontecer comigo, e ai vou me amigar com o medico, pois toda semana tenho que estar lá. Vou não! 

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