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sexta-feira, 10 de agosto de 2018

Reforma Política como grande arma da Democracia





“Democracia à mão armada

Por Fernão Lara Mesquita

Já que em reforma pra valer ninguém fala mesmo, lá vai só pra você saber como é.

O voto distrital sozinho só barateia o custo das eleições. O que é decisivo é armar a mão dos eleitores para depois das eleições. Lei de iniciativa popular todo mundo já tem. Mas retomada de mandato (recall) e referendo das leis aprovadas pelos legislativos por iniciativa popular é o que realmente as faz valerem exatamente como você as fez. Primárias diretas, eleições de retenção de juízes, defesas contra arrochos tributários, tudo o mais pode ser conseguido brandindo essas duas armas. O sistema tem de ser o distrital puro (misto é tapeação) só para garantir que elas sejam usadas com absoluta legitimidade e segurança para o regime.

A delimitação do distrito eleitoral é função do número de eleitores dividido pelo número de representantes que se quer ter em cada instância de poder. Mas a fidelidade dessa representação é tudo. Tem de ser pessoa a pessoa. A única base aferível para isso é o endereço do eleitor. Cada município pode definir quantos legisladores quer ter e qual o tamanho dos seus distritos eleitorais desde que siga a regra básica de quantidades equivalentes de moradores em cada um. O distrito é então desenhado sobre o mapa e daí por diante só o censo poderá levar a alterações. Os eleitores podem mudar de distrito mas o distrito só mudará de desenho se o censo demonstrar que houve grandes alterações na equivalência do número dos seus habitantes.

Em eleições estaduais cada distrito será uma soma de distritos municipais. Nas federais uma soma maior. 513 congressistas daria distritos de mais ou menos 400 mil habitantes neste Brasil de 207 milhões. Nos EUA, com 325 milhões e 435 deputados, cada distrito federal tem aproximadamente 700 mil habitantes. Os candidatos só podem concorrer por um distrito e cada distrito só elege um representante. Assim todos saberão o nome e o endereço de cada um dos seus eleitores. Não tem enganação.

No Congresso americano os deputados não representam um estado mas sim “o distrito número tal”. Não há vice nem “suplente”. Se alguém renunciar, morrer ou tiver o mandato retomado o distrito convoca nova eleição e elege o substituto. Não tem data marcada, nem para isso, nem para deseleger representantes ou funcionários eleitos. E quase todos os que têm função de fiscalização ou contato direto com a população como fiscais, auditores, promotores, xerifes, policiais e outros são diretamente eleitos.

A maioria das cidades americanas não tem mais prefeito ou vereador. Nos sistemas de City Council ou de City Manager, as variantes mais usadas, elege-se um conselho de cinco a sete membros chefiados por um CEO ou “gerente”, com metas precisas para entregar e demissível a qualquer momento. Como tudo que é importante será mesmo proposto por lei de iniciativa popular e/ou aprovado em referendo, os corpos legislativos, lá, são, cada vez mais, oficinas de acabamento técnico das leis.

Um recall, um referendo ou uma lei podem ser propostos por qualquer cidadão. Ele terá de passar uma lista no distrito afetado e colher assinaturas válidas numa quantidade pré-determinada (em geral de 5% a 7%) a serem aferidas pelo Secretário de Estado municipal ou estadual, funcionário que se dedica exclusivamente a organizar essas “eleições especiais” que acontecem a toda hora. Uma vez qualificada a proposta, haverá uma campanha de esclarecimento contra e a favor e então, ou a proposta constará da cédula da próxima eleição, ou será convocada uma “eleição especial” só no distrito afetado para um “sim” ou um “não”.

Nas cédulas das eleições majoritárias – presidenciais, estaduais ou municipais – aparecem dezenas de proposições geradas por esse sistema nas quais votarão apenas os eleitores dos distritos afetados. É nelas, também, que estarão os nomes dos juízes de cada comarca, coincidentes com um ou mais distritos eleitorais, com a pergunta: “O juiz fulano deve permanecer mais quatro anos na função”? Cada eleitor, portanto, preenche alguns quesitos e deixa outros em branco. O resultado será conferido a partir do seu endereço, daí as apurações lá demorarem tanto.

Cada cidadão, enfim, tem um poder decisivo sobre o seu pedaço mas ninguém tem poder sozinho sobre o todo. A constituição federal define o regime e as atribuições de cada ente federativo e de cada um dos três poderes, e só. Os direitos do cidadão e seu respectivo custo fica para as constituições estaduais e municipais que são revistas a cada 10 anos.

Nas ex-colônias inglesas da América, Ásia, África e Oceania, independente do grau de desenvolvimento, o distrito básico é o bairro que elege o school board de cada escola pública. Esse “conselho diretor” de entre cinco e sete membros constituído por pais de alunos é quem contrata (e demite) o diretor da escola e aprova ou não o seu currículo e o seu orçamento anual. Nos Estados Unidos as escolas têm a prerrogativa de emitir títulos de dívida para financiar projetos novos desde que atendam à regra nacional para isso, que torna obrigatório, para a emissão de qualquer dívida pública, um projeto mostrando quanto se quer arrecadar, em quanto tempo se dará o resgate, quanto vai custar e quem vai pagar. O projeto vai então a votação direta da comunidade afetada. O resgate normalmente é feito mediante um aumento temporário do IPTU somente dos moradores do bairro beneficiado. O estado só interfere para prover mais verba para escolas de bairros sem condição de se autofinanciar. O mesmo esquema é usado em obras como construção ou reforma de estradas, pontes e prédios públicos, aumentos de salário para esta ou aquela categoria de funcionários e etc., tanto nos estados quanto nos municípios. O resgate sempre é amarrado a algum mecanismo adstrito à comunidade beneficiada como pedágios, taxas adicionais temporárias nos combustíveis ou no imposto local de bens de consumo. Nem pensar em criar ou aumentar impostos sem consulta direta, no voto, a quem vai paga-los.

Na democracia à mão armada os reféns são “eles” e a corrupção e a miséria praticamente desaparecem.

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AGD comenta:

Já estive nos Estados Unidos, pelo menos, o tempo suficiente para, ao andar pelas ruas, ficar refletindo como eles podem ter cidades tão organizadas, mesmo como uma população, às vezes, alta e com um volume de veículos a dar inveja à Avenida Paulista, por exemplo, ou mesmo em Bom Conselho dia de feira.

Ao ler o texto acima do Fernão Lara Mesquita, já tendo, há algum tempo me metido na área de Planejamento Urbano, eu fiquei pensando, e quase descobri, porque lá as coisas dão certo e aqui, na maioria das vezes não dão. E o motivo é um só: A participação popular de uma forma adequada e agindo em seu benefício, tendo na mão a grande arma da Democracia que é o voto, junto com  a outra arma essencial que é a possibilidade de “julgar” a qualquer tempo seus governantes.

Vivemos num país onde a coisa mais difícil que existe é demitir um funcionário público. Suas leis emperradas e eivadas de privilégios constroem um sistema completamente ineficiente e que se propaga no tempo, gerando crises e mais crises, muitas vezes evitáveis, dando uma mudada na gestão. Isto se aplica também ao campo político.

Por que esperar que um vereador totalmente incompetente, como conheço vários, só possam deixar de cometer iniquidades depois de 4 anos? O prejuízo é muito grande e evitável com o chamado “recall” que é uma forma civilizada e eficiente de gerir o bem público, com a ingerência popular.

Participação popular, aqui, virou apenas um meio de proteger alguns partidos políticos que se vangloriam de ajudar os pobres, sem pensar que há sempre pobres e ricos numa comunidade e não se pode criar valores morais aceitos por todos para dizer que uns são melhores do que os outros.

Em suma, uma reflexão mais aprimorada e ampliada de uma reforma política que não passe do nome deve levar em conta as ideias desenvolvidas no texto acima transcrito.

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